a Sobre o tempo que passa: O filme do 30 de Maio de 1926, porque todas as revoluções são pós-revolucionárias....

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

30.5.06

O filme do 30 de Maio de 1926, porque todas as revoluções são pós-revolucionárias....



Bernardino Machado indigita Cabeçadas a formar governo, às 11 horas da manhã do dia 30, domingo, depois de convite formulado por Ribeiro de Carvalho.

Às 7 horas da manhã, Ferreira do Amaral, comandante da PSP de Lisboa, toma posse como governador civil interino de Lisboa. Gomes da Costa vai depois dizer que a guarnição de Lisboa não podia bater-se. Aderiu. E Ferreira do Amaral, confessar então querer um governo republicano e uma Constituição. Sem isso, é impossível a paz.

Depois de Cabeçadas endereçar uma carta ao Presidente da República, onde propõe a constituição de um governo de carácter extra-partidário, constituído por republicanos que mereçam a confiança do país, Bernardino logo o nomeia Ministro da Marinha e presidente do Ministério, acumulando interinamente todas as outras pastas. Repete o que fizera Saldanha em 19 de Maio de 1870 e Pimenta de Castro, em 25 de Janeiro de 1915, mas assumindo também os poderes que, antes, cabiam ao rei e ao presidente da república.

Governo de Mendes Cabeçadas (18 dias). Bernardino Machado convida Cabeçadas a formar governo, às 11 horas da manhã de domingo, 30 de Maio. Depois de Cabeçadas endereçar uma carta ao Presidente da República, onde propõe a constituição de um governo de carácter extra-partidário, constituído por republicanos que mereçam a confiança do país, Bernardino logo o nomeia Ministro da Marinha e presidente do Ministério, acumulando interinamente todas as outras pastas. Repete o que fizera Saldanha em 19 de Maio de 1870 e Pimenta de Castro, em 25 de Janeiro de 1915, mas assumindo também os poderes que, antes, cabiam ao rei e ao presidente da república.

Em 30 de Maio de 1926: presidente assume todas as pastas. Nesse mesmo dia é instituído um triunvirato com Cabeçadas na presidência, marinha e justiça. Gomes da Costa na guerra, colónias e agricultura. Armando Humberto da Gama Ochoa (1877-1941) no interior, estrangeiros e instrução.

Em 3 de Junho de 1926: Cabeçadas na presidência e interior; António de Oliveira Salazar (1889-1970) nas finanças; Manuel Rodrigues (1889-1946) na justiça; Gomes da Costa na guerra e colónias; Jaime Maria da Graça Afreixo (1867-1942) na marinha; Carmona nos estrangeiros; Mendes dos Remédios na instrução.

O 1º governo da Ditadura, presidido por Mendes Cabeçadas, tem três fases. Na primeira, em 30 de Maio de 1926, há apenas um Presidente do Ministério.

Na segunda, a partir do dia 31, o mesmo assume todas as pastas e concentra a plenitude do poder executivo, face à renúncia de Bernardino Machado.

Na terceira, desde 2 de Junho, o ministério é repartido por um triunvirato. O mesmo Cabeçadas fica com a marinha e a justiça, Gomes da Costa na guerra, colónias e agricultura, Gama Ochoa no interior, estrangeiros e instrução.

Em 3 de Junho, nova repartição: Cabeçadas na presidência e interior. Oliveira Salazar nas finanças. Manuel Rodrigues na justiça. Gomes da Costa na guerra e colónias. Jaime Afreixo na marinha. Carmona nos estrangeiros. Mendes dos Remédios na instrução. Ezequiel de Campos na agricultura e no comércio.

Ao começo da tarde do dia 30 de Maio sai uma nota da presidência da república anuncia as circunstâncias e Cabeçadas presta compromisso de honra cerca das 20 horas desse dia.

Bernardino Machado, através do seu secretário, Bourbon e Meneses, conferencia no Palácio de Belém, com os majores Ribeiro de Carvalho e Francisco Aragão, tentando também contactar com Brito Camacho que, entretanto, já tinha retirado para Aljustrel.

Na noite do mesmo dia 30, alguns republicanos dirigem-se a casa de Álvaro de Castro, a quem solicitam a resistência. Este, já deitado, levanta-se, e, de pijama, declara: não há nada a fazer. Chega a hora deles. É inútil tudo.

Nessa noite, a população de Lisboa, manifesta-se a favor do novo poder estabelecido. Grita-se morra o partido democrático e clama-se contra o governo de António Maria da Silva. Vitoriam o exército liberal, a República e Gomes da Costa. Até se notam grupos operários que saúdam a chegada da ditadura militar.

Entretanto, Gomes da Costa dá ordem a todas as forças militares para avançarem sobre Lisboa.

Cabeçadas, no dia 31, instala a presidência do governo no ministério da guerra e aqui, cerca das 16 horas, toma posse das restantes pastas ministeriais.

Realiza-se, contudo, a última sessão da Câmara dos Deputados, presidida por Rodrigues Gaspar, a que apenas comparecem 37 deputados. Da mesma forma sucede com o Senado, presidido por Correia Barreto, com 24 senadores. Ambos ainda recebem continência dos soldados da guarda à entrada no Palácio das Cortes. Abrem a sessão, mas logo reconhecem a falta de quorum. Soltam-se ainda, nas duas sessões, uns tímidos vivas à República, com os parlamentares monárquicos calados, mas a cumprirem a sua missão, não faltando um protocolar discurso do senador monárquico João de Azevedo Coutinho que faz o elogio formal de Correia Barreto. Às 16 h e 15 m chega um esquadrão de cavalaria da GNR que encerra as portas do Congresso.

No mesmo dia, Cabeçadas recebe carta de Bernardino Machado, ao retirar-se para a sua residência particular na Cruz Quebrada, onde o Presidente da República renuncia ao cargo de Chefe de Estado, confiando o mesmo ao Ministério em conjunto. Considera que restaurada a ordem pública sem violentas colisões e entregue a constituição de um Ministério Nacional a V. Exª, em quem a República tanto confia, a minha missão está cumprida. Esta carta será publicada no Diário do Governo de 12 de Junho seguinte, para os devidos efeitos.

Cabeçadas lê o processo, considerando que, em conformidade com a Constituição passa a ter a plenitude do Poder Executivo.

Entretanto, chega a Lisboa, no rápido da noite, Pedro de Almeida, delegado de Gomes da Costa, bem como os dois emissários que Cabeçadas tinha enviado ao Norte, Bragança Pereira e José Romão. O comandante, que se encontra junto das tropas bivacadas na Amadora, recebe-os de madrugada, numa reunião alargada a João Maria Ferreira do Amaral e a Oliveira Gomes, comandante da Escola Prática de Infantaria, que chefia as forças estacionadas na Amadora.

No Entroncamento, às 22 horas, já Raúl Esteves e Passos e Sousa congregam cerca de 2 000 homens, postos à disposição de Gomes da Costa que, no Porto, telegrafa aos últimos, dizendo que o governo de Lisboa não merece confiança e atraiçoa o espírito do movimento do Exército... Vou iniciar a marcha sobre Lisboa rapidamente.

Carmona estaciona em Vendas Novas comandando as forças do exército do sul.

Também a 31, o major Ribeiro de Carvalho, ainda apela para que se repita o modelo da Regeneração de 1851, com uma política ampla e de generosa conciliação nacional, reconhecendo que o movimento pode ser útil. Salienta que a vitória da revolução é, antes de mais nada, um triunfo da opinião pública. Os revoltosos venceram porque ninguém estava disposto a sacrificar-se por um governo que não traduzia os votos da nação.

Cabeçadas segue para Coimbra no rápido do Porto, logo de manhã. Gomes da Costa, sai do Porto, a meio da tarde, no comboio Sud, juntamente com o capitão-tenente Armando Humberto da Gama Ochoa, com o mesmo destino (1 de Junho). Têm uma conferência de reconciliação, nessa cidade do Mondego, ao fim da tarde. Dela resulta a nomeação de um triunvirato provisório, com Cabeçadas e Gama Ochoa, até então representante de Gomes da Costa no Porto e seu homem de confiança. Cabeçadas regressa a Lisboa, no rápido da noite, acompanhado por Filomeno da Câmara Melo Cabral e Raúl Augusto Esteves.

Gomes da Costa, que segue no mesmo comboio, desce no Entroncamento. Entretanto, Pedro de Almeida é encarregado de contactar Mendes dos Remédios, Oliveira Salazar e Manuel Rodrigues, para os sondar no sentido de entrarem para o governo.

Cabeçadas chega a Lisboa já de madrugada (2 de Junho). Declara aos jornalistas a constituição de um triunvirato provisório, dado que o ministério definitivo seria formado, depois da chegada de Gomes da Costa a Lisboa, e para o qual seriam convidadas entidades de reconhecido mérito e provada honestidade.

Decreta, então, a distribuição das pastas ministeriais, atribuindo a Gomes da Costa as da guerra, colónias e agricultura, e a Gama Ochoa, as do interior, negócios estrangeiros e instrução (decreto publicados no Diário do Governo do dia 2, mas com a data do dia 1, com Mendes Cabeçadas a assumir-se como Chefe de Estado).

Noutro curioso decreto, em simultâneo, Cabeçadas demite-se a si mesmo: é um caso inédito na história da República: um chefe de Governo demitir-se a si próprio. Sucedera assim porque também é Chefe de Estado (Rocha Martins).

Gomes da Costa sai do Entroncamento e vai para Tancos, donde emite um telegrama a todas as unidades militares, onde declara discordar da atitude de Cabeçadas: comunico, para conhecimento de todos os oficiais, que não estou de acordo com a notícia dos jornais acerca da formação do Ministério, continuando à frente do movimento de carácter exclusivamente militar, para engrandecimento da Pátria e para bem da República e do Exército. Gomes da Costa, General.