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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

8.5.07

Nesta ditadura da incompetência, onde voltam a soprar os ventos da vindicta e da persiganga...


Entre a crise autárquica lisboeta e a eleição do parlamento madeirense, começam a surgir, gotosamente, algumas fugas de informação sobre a nova arquitectura das universidades lusitanas, concebida pelo revisionista compêndio histórico do ministro Gago, que, para o efeito, invoca o carimbo de um estudo da OCDE e o conceito indeterminado da reforma bolonhesa. Se as linhas gerais da nova filosofia parecem libertadoras, face ao neocorporativismo do conselho de reitores e da corrente de endogâmicos que os suportam, não me parece que a política de sigilo deste "agenda setting" seja propícia à dignidade daquilo que pretende continuar a ser a principal fábrica das elites lusitanas.


Quando se instalou a instabilidade do provisório que espera os sinais da voz daquele tradicional dono decretino que vai emitir uma "révolution d'en haut", pode acontecer que a transição transforme o mesmo provisório em definitivo, aumentando o pantanal dos provisórios definitivos e dos definitivos provisórios, onde, não havendo rei nem lei, despertem os pequenos césares de multidões que, entoando a música da orquestra do Titanic, não nos deixem detectar o choque desta chapa veiga-simonista, muito prequiana e pós-revolucionária, com o "iceberg". Se já vislumbramos a parte visível desse bloco de gelo, continuamos a não conhecer as profundezas do leviatânico monstro e são poucos os botes salva-vidas disponíveis.

Entretanto, já saíram da toca os muitos ratos e os seus habituais tocadores de flauta que foram aos arquivos da sua "forma mentis" totalitária e voltaram a entoar as pautas da extrema-direita e da extrema-esquerda, regressando os toque de caixa dos saneamentos, com os consequentes subsistemas de medo, não a caminho da revolução, mas do rancho da empregomania.

Quase todos parecem esquecer-se dos clientes, isto é, dos jovens que foram apanhados pelas ratoeiras destes carreirismos e que, infelizmente, voltaram a viver como cobaias em laboratórios de vaidades, onde, em vez da luta de classes, se manifesta indecorosamente essa energia da história chamada inveja, com o consequente desespero da nova encomendação feudal.


Por isso, repito a história que há dias ouvi, de um desses caçadores de cabeças que, depachado do centro da Europa, costuma vir a Lisboa fazer recrutamento de técnicos e de cérebros. Dizia ele que Portugal, neste momento, é um terreno de eleição, porque consegue levar os melhores que, aqui, não entram nos recrutamentos dominados pela cunhocracia e os "jobs for the boys" da partidocracia e do amiguismo fidalgote, castífero e capitaleiro.

Se Gago não gaguejasse, seria útil que a respectiva reforma quebrasse este atavismo plurissecular. Acontece apenas que a aplicação ao terreno social do belo princípio da igualdade de oportunidades, a nível do sistema de ensino, corre o risco de regredir, para gáudio de um situacionismo, cada vez mais enredado na tradicional ditadura da incompetência, onde regressam os ventos da vindicta e da persiganga. Por favor, onde fica o exílio?