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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

23.1.08

Sobre os correias que acamparam no aparelho de Estado


Sócrates teve ontem dois dos seus heterónimos em palco: António Nunes, no parlamento, e Correia de Campos, na televisão. O primeiro optou por ser homem comum, confessando que pecou por palavras, mas não por obras. O segundo continuou nos seus malabarismos de verbosos saltos em frente, brincando com mártires, a quem chamou vitimazinhas.


Mesmo quando, aqui e além, se discorda do primeiro, nem por isso temos de concordar com todas as diatribes a que está sujeito, mesmo que venham de um antigo ministro da mesma fiscalização económica do primeiro governo soarista, agora esquecido que, quando assumia o estadão, até emitia despachos proibindo membros de comissões de trabalhadores da prestação de declarações públicas, assim confirmando como o poder significava ter o monopólio da palavra. Eu próprio, quando era meio sindicalista do ministério em causa, fui vítima desse autoritarismo e, portanto, não esqueço os tempos do cabaz de compras e dos tabelamentos.



No caso da ministerial figura que nos trata da saúde, julgo que qualquer especialista em estudos de opinião reconhece que ele bateu os recordes do Guiness em termos de baixa em sondajocracia, mesmo quando o aconselharam a elogiar a sua antecessora Leonor Beleza. Aliás, já recebeu, de dois ilustres socialistas, Manuel Alegre e António Arnaut, o adequado tratamento de pesadelo. Porque mesmo o Lino do "jamé", apesar de tudo, tem pinta de gajo porreiro e até eu era capaz de lhe confiar a carteira, não subscrevendo os ataques hipócritas de que tem sido vítima por parte de alguns "bem pregas, frei tomás" que foram para a televisão insinuar que o mesmo depois de uma refeição bem tocada ficou a ver camelos em sítios que nunca foram deserto.




O mais me aflige no segmento correiacampista da nossa administração pública é mesmo o facto de ele ser professor de administração pública da saúde e de ter sido presidente do emblemático Instituto Nacional de Administração, julgando que a "era dos managers" ainda é chão que dá uvas. É que muitos destes gestores de obra feita pelos operacionais e criativos acamparam na máquina gerando correias de cogumelos pouco comestíveis, poluindo o sentido de serviço público e transformando importantes segmentos do aparelho de Estado em grevistas de zelo.