a Sobre o tempo que passa: De Monsieur de la Palisse aos intérpretes da PIDE. Um abraço ao Jumento

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

4.11.08

De Monsieur de la Palisse aos intérpretes da PIDE. Um abraço ao Jumento


Acordo no "day after" ao dia 4 de Novembro, mas tenho de concluir que, ao contrário de Monsieur de La Palisse, uns quartos de hora depois do dia da mudança, por estas bandas do sol nascente, ainda não sabemos se houve mesmo mudança, talvez daqui a quatro horas, quando estiver a começar a minha aula. Daí que, olhando à distância para certas coisas que acontecem em Portugal, fique sem saber se estamos perante uma anedota ou uma realidade. O ministro pleno de cãs que agora toma a decisão fundamental de propositura da nacionalização do BPN é exactamente o mesmo que terá dado cobertura a um privado bancário do BCP que, há meses, era director-geral público dos impostos, com muitas ostentações missais. Parece que o senhor terá recorrido à Interpol para saber quem era o meu amigo Jumento, coisa que toda a gente que almoça no Martinho da Arcada conhece e a quem tive o prazer de ser apresentado, sem qualquer clandestinidade, numa cerimónia de lançamento de um livro de ficção na FNAC do Chiado. O professor Teixeira dos Santos, de tantos valores imobiliários e contactos insulares com o arquipélago crioulo, se quiser tomar uma biquinha lá perto de seu gabinete, basta perguntar ao empregado de tal café quem é o senhor doutor que anda sempre com uma grande máquina fotográfica a apanhar perspectivas de certas aves de arribação que se passeiam pela estátua de D. José...

O velho Raymond Aron chamava a esta inundação do centro do poder por informações secundárias, ao mesmo tempo que o mesmo centro não conseguem detectar colossais sinais de BPNs e BCPs que, como todos sabem, antes de o serem já o eram, qualquer coisa como concentracionarismo, exactamente o mesmo vício que marcou o sovietismo, morto quando um pequeno avião do jovem Mathias Hurst aterrou em plena Praça Vermelha de Moscovo ou quando a informação de Tchernobyl não chegou a Gorbatchev a tempo e horas. Quando o  superministro das notas e moedinhas, de tantos imobiliários valores, se preocupa com o Jumento e e com os "mails" dos funcionários, resta-me sorrir com a comédia, mas preocupar-me com o drama pombalino que pode redundar em tragicomédia. Mesmo aqui de Dili, sou capaz de notar o perigo desta não-denúncia de mais um condicionamento à liberdade de expressão. O problema está no exemplo e até no desperdício de dinheiros públicos gastos nestas legalíssimas incursões do policial supra-estatal de um director-geral que gostava de missas.

Sobre a matéria, apenas me apetece recordar uma velha história de certa polícia política à moda do Porto nos tempos negros do salazarismo, quando um conhecido intelectual também dito Salazar, mas anti-salazarista, foi apanhado nas teias concentracionárias de uma também legalidade, tão vigente então, quanto a dos teixeiras e macedos de hoje, tal como já foi das rodrigues, dos televisivos e estradais gestores do ano, tal como pode vir a ser de outras ministeriais notabilidades que andam distraídas. O desmiolado polícia, lá dos anos trinta, não entendendo os argumentos filosóficos do subversivo, tratou de utilizar uma técnica notabílissima, pedindo a um grande professor de filosofia que descodificasse as suspeitosas declarações do homónimo do grande chefe. Leonardo, o intimado descodificador, parece que terá ficado farto da coisa, declarando que professor não era intérprete.

Paradoxalmente, o socratismo, com tanto Magalhães à moda do Norte, ficará para a história com estas manchas macedais e DRENais e outras coisas que hão-de ser ainda mais, quando bastava ao ministro Teixeira, avançar um pouco nas Arcadas e subir ao gabinete de outro governamental Magalhães, para este lhe explicar que blogues não são todos como os que o presidente Costa considera um submundo. Blogues são coisas como as canetas, os lápis, as escritas, isto é, são simples meios ao serviço de fins, que podem superiores ou inferiores. Não vale a pena o velho recurso ao chamado obscurantismo, como era o da não alfabetização dos populares para que estes se metessem com filosofias de subversivos. O ministro Teixeira não deveria ter caído na esparrela. Que Magalhães lhe perdoe... e um abração de solidariedade com o Jumento. Quando eu voltar de Timor, se não formos, os dois, apanhados pelo medo da Interpol, temos que voltar a uma almoçarada em gargalhada, que, segundo dizem os clássicos e os actuais, sempre foi a melhor forma de dar cabo do medo...

PS: Na hora do almoço cá da ilha, com sopinha de legumes feita em casinha, lá assisti em directo aos filmes e comentários da RTPI entre o senhor Doutor Nuno Rodrigues dos Santos e a a Drª Judite de Sousa. Só assistindo ao facto histórico é que nos poderíamos inteirar daquelas excelentes preparações que tanto falavam no presidente da zona, como no sermão da religião não precisada, onde faltaram os lugares comuns da humildade da pesquisa, como aqueles que exigimos aos comentadores dos jogos de futebol, especialmente dos internacionais. Um conhecimento modesto sobre essas coisas supremas bem nos poderiam ajudar. Depois, transmitirmos esse amadorismo para todo o mundo, repetindo gnosticismos de pacotilha é não prestarmos um bom serviço público. O Vítor Gonçalves e a Márcia, pelo menos, sabem observar. Isto é, mesmo com atributos académicos, não deixam de ser jornalistas.