a Sobre o tempo que passa: Apologia das coisas profetizadas I

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

4.11.09

Apologia das coisas profetizadas I


Há um bom par de anos, em 1996, terminava um desses manuais universitários da seguinte maneira: Hoje a Europa tem uma bandeira azul, com uma coroa de doze estrelas, não uma estrela por Estado, mas o emblemático número doze, considerado símbolo da plenitude e da perfeição, como doze eram os filhos de Jacob, os trabalhos de Hércules, os signos do zodíaco, os meses do ano, os apóstolos ou a romana lei das doze tábuas.

Doze estrelas, como as da auréola de uma Virgem que aparece no vitral da catedral de Estrasburgo, uma mulher vestida de sol, com a lua debaixo dos pés, tendo uma coroa de doze estrelas sobre a sua cabeça (et in capite eius corona stellarum duodecim)...

Tudo muito conforme, aliás, com o capítulo XII do Apocalipse de S. João.

Compare-se o que a respeito escreve o nosso Padre António Vieira, onde se fala numa Mulher em dores de parto, dando à luz um Filho varão que, no entanto, há-de reinar sobre todas as nações do mundo com ceptro de ferro. Se um Dragão tenta tragá-lo, eis que ele acaba por ser arrebatado ao céu, onde acabará por assentar-se no trono de Deus. À Mulher se darão duas grandes asas de águia com que fugirá do Dragão. Virá depois um Cavaleiro, montado num cavalo branco, trazendo, na orla do vestido, a divisa rex regum et dominus dominantium, comandando um exército, também montado em cavalos brancos, que acabará por vencer o Mal, isto é, a bestialidade do Dragão e os falsos profetas que o seguem.

Interpretando tal passagem, o Padre António Vieira considera que se trata de um relato da emergência da Igreja do Quinto Império, onde se descreve a maneira da Igreja se coroar, e alcançar o Reino e império universal, onde a Lua é o Império Turco (ou o império dos que apenas têm poder temporal) e o ferro, a inteireza e constância da justiça e igualdade com que o mundo há-de ser governado.

Tratar-se-ia da procura de um poder que não está sujeito às inconstâncias do tempo, nem às mudanças da fortuna e que se há-de estender até ao fim do mundo. Porque só então chegará o corpo místico de que fala São Paulo, com Cristo a nascer de novo. O tal Filho, que tem o trono no Céu, tal como a Igreja tem uma coroa na terra.