a Sobre o tempo que passa: A luta do Leviatã: ou o horizonte do nosso desprezo. De M. Teresa R. Bracinha

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

18.11.09

A luta do Leviatã: ou o horizonte do nosso desprezo. De M. Teresa R. Bracinha


Um dia escutei alguém dizer que a característica dos portugueses em dizer mal de Portugal, reside no facto de se esquecerem de dizer que se Portugal existe tal qual, é para não ser incongruente com os que o criticam sem pudor ao mesmo tempo que se não coíbem de lhe dar um jeito informe. Na realidade, as pessoas em Portugal têm a tendência para culpar os outros dos defeitos de que são titulares.


Em muita verdade, rejeitam o nacional como quem rejeita o que é ou o que foi o seu passado mais remoto ou mais recente, ou como dizia Groucho Marx , saindo do nada, cheguei à miséria, e desta se não dão conta do zero contributo em que teimam.


Confunde-nos que se chame mundo à existência parca e desintegrada onde os alicerces de madeira podre assentam arraiais. Confunde-nos o nanismo inchado de maldade grotesca e ávido de provocar sangue e sofrimento, qual desafio de dança bamba à lei da gravidade.


Para sermos francos, a ânsia destes reles primatas de má estirpe revela-se no rosto seco, não nutrido, de quem a cada hora luta por um mundo imóvel, já que nunca o entendeu em movimento, em mudança, em cor que traz em si o bem, visto este como a percepção de uma cura ecológica do aperfeiçoamento do próprio pensar.


Por incrível que possa parecer, existem escolas calóricas destinadas a estas criaturas que aceitam que as fábricas-escolas interpretem o princípio dos elos não comunicantes e os façam papaguear as ingestões das supostas mencionadas calorias.


Como dizia Almada Negreiros «a alegria é a coisa mais séria do mundo», mas como será possível que os entes que mencionámos a possam entender? Como?, se só sabem boiar do lado de lá do nascimento?


Em Maio de 68, Bob Dylan, referia-se à palavra confiscada e ao escândalo que representava essa situação face aos direitos dos homens. Hoje, ainda hoje, no sec. XXI, este confisco perpetua-se em metamorfoses sucessivas.


Cessou, na maioria, o poder de uma determinada originalidade de Maio, para utilizarmos a expressão de Edgar Morin, e ainda que Maio tenha significado mais do que o que realizou, recortemos na memória as palavras escritas nas paredes da Sorbonne… «Não tenho nada para dizer mas quero dizê-lo».


Diga-se, assim, que a supremacia da imaginação sobre a realidade tem rasgado os horizontes, mas reflicta-se a que preço se tenta mudar um sistema assente num domínio de underground, de onde se comandam vidas humanas e se direccionam as que nunca nasceram, mas que voluntárias aceitam, sem interregno, aplicar as regras do divórcio entre a existência e a consciência, entre a proliferação da cultura e a réplica do espectáculo do absurdo situacionista, sinónimo do congelamento do sentido da vida.


O espaço e o tempo encontram-se saturados. Ao ruidoso ruído que transtorna qualquer equilíbrio, dá-se folga.


O povo desta nação corre sérios riscos de se tornar mero público de um folhetim patético.
As desigualdades sociais clandestinam-se no receio de reivindicarem direitos.


Apesar da grave crise económica, esta não atinge a não-vida que acima referimos, antes, a mesma, se assume e sobressai numa autogestão pidesca transformada em vítima, quando necessário, qual ditador subitamente democratizado.


Mas há quem contrarie os propósitos. Valha-nos a paz da consciência como sempre nos recordou Ruy Belo, valha-nos recordar quando nos falta o mar.

M. Teresa Ribeiro Bracinha
18.11. 09


PS: Imagem picada aqui