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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

11.12.04

Porque hoje é sábado, neste fim de ciclo igual ao que aí vem



Sei que dissolvente é o que não está insolvente, mas o absoluto pode não ser um dissoluto. Tudo depende do soluto, do coxo, da soltura, do assimétrico, do mandado, do mandato, do mandante e do que se manda para o maneta. Com efeito, há um Portugal que resiste em liberdade livre, onde há gente cujo preço é não ter preço, daquela gente que tem o prazer de cumprir uma missão. Gente que serve sem procurar a lambida contrapartida da pequena troca negocista. Mas leio: "Portas aceita coligação. CDS hesitou muito mas sondagens foram fundamentais. Um acordo de coligação terá ficado fechado ontem à noite entre Santana Lopes e Paulo Portas. Os dois líderes combinaram encontrar-se logo após a comunicação de Jorge Sampaio e, apesar do clima de dúvida que minou as direcções do PSD e do CDS ao longo da semana, esperava-se a confirmação do acordo. Sociais-democratas e democratas-cristãos encomendaram sondagens e passaram os últimos dias a avaliar as perdas e ganhos dos vários cenários".



Sei também que sofremos daquele tradicional humor merancórico desta lusitana dor da saudade que nos deu independência e que nos pode voltar a dar futuro. Há livres gestos que podem semear revolta. Mas leio: "Depois de em 2003 terem sido aprovadas as leis dos partidos e do financiamento partidário, a nova legislação eleitoral para a Assembleia da República e as autarquias e a limitação de mandatos ficaram adiadas com a decisão do chefe de Estado".



O nosso jorge, o nosso pedro, o nosso paulo, o nosso sócrates, o nosso jerónimo, o nosso louçã são simples consequência deste paralelograma de forças. Não são causas, são sintomas. Dos truques e aldrabices politiqueiras. Dos prestidigitadores que fingem ser excelentes ministros. Dos arrebentas que, dia a dia, vão destruindo as flores da manhã e as calmas dos poentes, com seus roncos de mecânicos "leasings". E leio: "As entidades financeiras, os bancos e os serviços dos registos e notariado denunciaram, em apenas dois meses e meio, 150 operações suspeitas de branqueamento de capitais. A revelação foi feita ontem pela directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Cândida Almeida, numa conferência relativa à autonomia do Ministério Público, mas que a magistrada aproveitou para revelar as fragilidades logísticas do seu departamento, tendo em conta o trabalho efectuado. Só em investigação estão 300 processos de criminalidade grave e altamente complexa".



E lá estamos em mais um interregno, neste fim de pátria, neste fim de ciclo, onde raros são os homens livres, sempre vistos como párias, como mal-amados, como essas imprevisíveis criaturas que não obedecem ao normalizado dos preconceitos, nesta uniformizada fileira do mais do mesmo. Por isso, quando caem os governos, permanecem os eternos ministros clandestinos, como vôvô Simão e outros vôvôs que ele pôs na rede, conjugando modernidade, ao fim de mais três década de reformadores oficiais e de semeadura de tachos aos serviçais. E sua excelência veio hoje perorar ao "Jornal de Notícias" dizendo do que ele fez e desfez: "A avaliação feita até aqui teve alguns méritos e algumas consequências internas". Proclamando que "encara com optimismo o novo paradigma que está a ser desenhado para o Ensino Superior". Dito "Autor de estudos e pareceres sobre a actual reforma desenhada pelo Processo de Bolonha, Veiga Simão defende um maior investimento na formação ao longo da vida, que permita qualificar os portugueses". E mais acrescentando: "Algumas universidades, perante as recomendações feitas, tentaram modificar-se internamente. Não se sabe muitas vezes quais, o que é pena. Lamentavelmente, os interesses corporativos têm dominado o processo".



Logo, elogia a graça de uma "ministra" que "criou 23 grupos de trabalho e a solução a encontrar não pode ser idêntica para todas as áreas do conhecimento". Invoca o abstracto da "obtenção de um standard comparativo europeu". E proclama, com toda a banalidade: "os alunos têm de trabalhar mais, fazer mais trabalhos individuais. E os professores terão de se aproximar mais dos alunos e modificar as suas metodologias, sem o que a reforma poderá ser uma farsa. O gestor universitário não pode estar ao nível de um funcionário administrativo, mas sim, pelo menos, de um vice-reitor". E não há poderes presidenciais que o dissolvam, nem governos que dele, e deles, não tenham medo.



E por cá vou ficando vítima destes simões, destes maputos onde ele assenta, e destes salazarentos que ele recicla. Estou aqui bem por dentro das dores de uma pátria onde efectivamente continuam a mandar os fios sustentadores deste teatrinho de fantoches. E leio: "A administração fiscal quer notificar os clubes de futebol que ainda não liquidaram dívidas abrangidas pelo chamado "totonegócio" e já apresentou uma proposta para superior decisão política".



Não, não irei por aí, pelos caminhos de ministros do antigo regime que, depois de inscritos e feitos ministros do PS, se voltaram para o PSD e para negocismos políticos com o CDS, não deixandio de ir ao repasto de Soares. Por mim, não irei pelos caminhos do fingimento dos que se pensam amestradores da sondagem, da sacanagem e da imagem. E leio: "Uma rede de falsificação de documentos de alta qualidade foi desmantelada em Lisboa, levando à detenção de 14 indivíduos, dois dos quais se encontravam evadidos de prisões". E mais leio: "Participantes no encontro consideram que a zona do Técnico, em Lisboa, é o local com mais prostitutas de rua, ao contrário de Monsanto, onde já não há «ataque». Vale-nos, que, mesmo dissolvido, o Ministro da Defesa diz ter «alternativas», caso o grupo que vai construir os blindados não consiga concretizar o arrendamento das instalações na Amadora". Vale-nos que o Bloco de Esquerda frisa que "governar não é uma forma de ocupação dos tempos livres" .



Dissolvamos esta gente de plástico com o dente polido em máquinas de rejuvenescimento dos "health clubs" da reciclagem fina. Portugal não tem que ser governado por hermafroditas politiqueiros ou por velhos amuletos que se dizem inteligentes só porque nunca arriscam uma crença ou apostam numa opção, em momentos de encruzilhada. Todos esses falsos patriotas sem sonho que, pela engenharia conceitual e pela estatística, manipulam o vulcão das emoções. Essas geométricas criaturas que nunca se emocionam com um dia de sol na cidade e que continuam a procurar o respectivo baixo clímax com violações dos direitos dos outros, utilizando a técnica inquisitorial e pidesca da ameaça e da persiganga. Homens sem fé, gente sem espinha. Viva a Dona Maria da Cunha e os seus sopeiras!