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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

18.1.05

A Santa Aliança das tiazinhas com os bloqueiros



Nos tempos dos ideologismos delirantes dos tempos do fim do antigo regime e do "prec" que tal esquizofrenia gerou, a causa de todas as nossas crises chamava-se "burguesia", como se ela alguma vez tivesse existido, a não ser no Porto. A sincrética coisa social que recebia esse nome não passava da casta dos contínuos dos donos do poder, num misto de fidalgote falido e de devorista assanhado, especialista nos sucessivos adesivismos que marcam o crepúsculo, ou a génese, de qualquer regime lusitano e que durará "ad nauseam", enquanto a capital estiver mentalmente onde está: no umbigo serviçal dos mandadores.

Essa tal coisa social que persiste camaleonicamente, mantendo o cobarde equilibrismo e o opostunismo balofo, parece extasiada pelo falso brilho de alguns dos respectivos filhotes que a si mesmos se decretam como "as elites". Assim, depois de estar cansada de enviar, para as feiras do Norte, alguns dos respectivos gladiadores populistas da direita a que chegámos, depois elevados à categoria ministerial, parecem agora virar à esquerda e tratam de pactuar com os irmãos e primos dos ditos, os tais que ainda não se conseguiram curar da epidemia do revolucionarismo frustrado.



Com estes olhos, já eu vi como as tias da linha de Cascais e da Avenida de Roma, embora com alguns maus fígados e certos brilhantismos de falantes picaretas, estão sequiosas desse radicalismo verbal e desse ilusionismo conceitual, julgando que assim lhes será concedida uma absolvição colectivista para a respectiva má-consciência.

Ao contrário de alguns receosos puritanos que, em muito ulcerosa indignação, temem a chegada desses vermelhuscos albaneses, bem desejaria que tal coisa social pudesse ter os respectivos destinos norteados pelas legiões vingadoras do major Tomé e que todos fossem à missa por alma de São Trotsky.



Os nossos bloqueiros, tão deliciosamente elogiados pelo Marocas, tão subliminarmente invocados por Freitas do Amaral e não sei se tão temerosamente contratualizados por outros senadores, à espera de biografia histórica que os livre da maldição, os nossos anacletos, fazendas, lopes e rosas parecem-se mais com certo folclore lusotropical das confrarias apoiantes do lulismo. Apenas não têm o misticismo sincrético dos antiglobalismos brasileiros, esse que consegue misturar o retrato de Che Guevara com citações telúricas de São Francisco de Assis. E por cá ainda há o Jerónimo...




Aqui a teologia da libertação andou em dó menor à volta do Senhor Padre Milícias e de Frei Bento Domingues, teve uns picos de anticapitalismo militante com a LUAR e o PRP-BR, mas, depois, preferiu ir ao jantar de homenagem a Soares. Porque se os bloqueiros forem a balança do regime, incomodando o sonho maioritário de Sócrates, apenas poderemos concluir como seriam baldados os longos e coerentes esforços de uma esquerda democrática e pluralista que, mesmo quando se afirmou socialista, nunca desdenhou a religião secular do liberalismo político.