Declaremos guerra à nossa impotência! Clamemos "Nunca Mais"!
Imagem picada em Passo a Passo
Ainda anteontem, em plena Cruz Alta, olhando a minha pequena pátria, meditava na circunstância de terem ardido 30 000 hectares dos 40 000 do concelho da Pampilhosa da Serra. Ainda ontem senti, no próprio local, os caprichos do vento e o drama das aldeias na rota do fogo, sempre aqui tão perto.
Digo, como toda a gente, com palavras de todos os dias, que isto é uma tristeza. Por isso declaro que importa compreendermos a razão do desastre e não lavarmos as mãos como tecnocratas com o próximo livro branco que ficará, mais uma vez na gaveta, quando voltar a chuva do Outono. Digo das chamas inesperadas e velozes, deste desespero que nos leva a concluir que lutar contra o fogo parece tarefa não humana.
E não ouço, nem quero ouvir o que disse Sócrates em Abrantes, depois de regressar do safari, ou o que vai dizendo Sampaio, depois de interromper as férias. As estatísticas podem até dizer que este é o ano pior, em termos de perigo, para os incêndios. Que já vamos em 23 000 ocorrências ou que tivemos num só dia quinhentos fogos em onze distritos, até porque ainda temos cerca de meio milhão de proprietários florestais,... etc.
Imagem picada em Steve Bull
Mas soa a impotência clamarmos agora que a protecção civil somos nós todos, só porque dizem existir uma simultaneidade raramente verificada. Porque não chega pedir ajuda aos autarcas e aos párocos, nem que seja para o rescaldo. Não basta o tratar a coisa com mais urgência quando se trata de casas ardidas e de pessoas desalojadas. Se calhar, há que ser mais enérgico e declarar formalmente guerra à coisa. Apelar à resistência civil, impedir que os candidatos a autarcas utilizem a palavra incêndio na campanha eleitoral, proibir aos candidatos presidenciais que façam a demagogia típica dos bombeiros pirómanos.
É por isso que percorri a sombra profunda das árvores centenárias do Buçaco, a aquífera paisagem de uma serra que ainda resiste, as matas antigas sem resinosas e a calma nocturna da Curia, onde, de noite, uma banda de professores em férias, marcados pela pesquisa da chamada música popular, davam percussão céltica a uma identidade que parece ameaçada. E ainda soam em meus ouvidos os acordes de uma gaita de foles, onde apetecia pôr uma letra que clamasse o "Nunca Mais!".
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