a Sobre o tempo que passa: maio 2009

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

29.5.09

Entre São Domingos, Aljustrel e a Panasqueira, com passos trocados, sem a disciplina das correias



Quebrado o velho armístício, as duas correias de transmissão de interesses, pressões e canalizações do nosso situacionismo, continuam os insultuosos bailados de campanha, sem este garboso marcar passo dos restos de estalinismo bombista da revolução por cumprir. Por mim, que sempre prefiria um partido pirata, vou tentando ouvir as palavras da Professora Manuela Magno, as intervenções do Frederico do PPM, ou os ensaios de dinâmica de grupo da Laurinda Alves, em nome do respeito pelo princípio básico da igualdade de oportunidades. Rio-me com a polémica que rodeia o imposto vital, quase tão nebuloso para as massas que vão às feiras, quanto o testamento também vital que o parlamento ontem aprovou na generalidade, graças aos esforços da minha querida amiga Maria de Belém.

Noto que, na verdade, há muito pagamos impostos europeus, sem qualquer clandestinidade, como muito bem poderia explicar qualquer especialista em IVA. Porque qualquer transferência de soberania para uma qualquer comunidade política supra-estadual implica a inevitável democracia fiscal desta, apenas lamentando não haver um adequado imposto mundial que bem poderia incidir sobre as transacções bolsistas, conforme propostas de um prémio Nobel que sabe mais economia do que eu. Um qualquer federalista e um qualquer adepto de certos segmentos de república universal não pode desejar outra coisa, caso não padeça do pecado da hipocrisia.

Claro que não vou falar da poeira de Dakar, que as notícias transformaram em lama, nas desventuras das briosas avenças, ou naqueles lamentáveis comentários de um juiz sobre o caso da criança russa, onde ele confessou que apenas julgou por papéis fornecidos pelos burocratas do apoio social. Se a administração da justiça em nome do povo não resistir a estas tentações do microfone de "talk show" ao ritmo pimba, tais declarações ombrearão com as bocas dos ministros do trabalho e da justiça sobre a matéria. Isto é, são todas lamentáveis e susceptíveis de mais um choradinho do senhor bastonete dos abacates.

Claro que o Professor Vital, ao pisar o risco dos qualificativos serenos e ao confundir o partido concorrente com as zonas de roubalheira, ficou tão excitado que até trocou o Leste com o Oeste alentejanos dizendo que as Minas de São Domingos são as de Aljustrel, talvez porque no subconsciente estavam as da Panasqueira, com a inevitável lembrança das roubalheiras dos romances do volfrâmio de mestre Aquilino Ribeiro, que até rimam com Cova da Beira. Naturalmente, o mais jovem docente Rangel chama um figo a esses jogos florais do espumante da Bairrada e, com o verrinoso da Foz do Douro, mas sem pronúncia à moda do Norte, replicará com nova facada verbal, para que Manuel Alegre conclua, e muito bem, que nenhum deles está a querer discutir o mandato para a Europa que pedem ao povo.

Por estas e por muitas outras, somos obrigados a concluir que esta campanha não tem passado de um péssimo filme de série B, dependente das cenas de outras longas metragens, desde o BPN ao longo parto da eleição do novo Provedor de Justiça, dado que os sobreiros do BES, os submarinos e os sucessores do Chaimite ameaçam fazer concorrência de parangonas a Constâncio, a Berardo e ao futuro treinador do Sport Lisboa e Benfica, neste mais do mesmo que nos vai minguando em entusiasmo cívico.

28.5.09

Cavaco e o pés de barro do cavaquistão, ou de como nos começamos a ver livres de certa tralha


Dias Loureiro não é Cavaco Silva. Tal como Cavaco Silva não se confunde com um qualquer dos seus apoiantes. Ou com a soma dos membros da respectiva comissão de honra, na sua última candidatura. Aliás, o lugar de Dias Loureiro dependia da confiança do Presidente. E a confiança pública que tem de se dar é ao espaço do poder do Presidente. Logo, a entrada e a saída do Conselho de Estado não dependem da opinião pública. Até porque se Dias Loureiro se mantivesse no Conselho, tudo aquilo que era para criticar em Loureiro recairia naturalmente em Cavaco Silva. 

Loureiro deve estar de consciência tranquila, de acordo com uma expressão que, de tanto se gastar pelo mau uso, já não tem o sentido de autenticidade dos gestos. Porque nem tudo o que lícito é honesto, de acordo com o conceito do "honeste vivere" do velho estoicismo romano, um dos três pilares da justiça, ao lado do "alterum non laedere" e do "suum cuique tribuere", coisa que no primeiro ano jurídico era muito bem ensinado por Sebastião Cruz nas aulas de direito de Coimbra, que deveriam ter sido assistidas por todos os nascidos em 1951, como eu. 

É evidente que Presidente também deve estar em desconforto, porque certamente está melhor informado do que os cidadãos comuns e é particularmente conhecedor da metodologia típica de Loureiro. Mais nada. Não foi o presidente que conheceu El-Asir através de almoços, jantares ou lanches com Bill Clinton, ou o rei de Espanha, nem também foi o presidente que elevou tais circunstâncias das revistas cor-de-rosa a discurso de defesa diante do parlamento. O presidente é de Bloiqueime, mas não é tão provinciano, embora não tenha gostado de o ver ontem a falar ao país com o antigo candidato Joaquim Ferreira do Amaral em fundo.

Contudo, PS e PSD são irmãos-inimigos, para o bem e para o mal. O bloco central de interesses, ao permitir a criação destas plataformas giratórias entre o negocismo e a politiqueirice dá uma péssima imagem da classe política e a única solução não é a do populismo falsamente moral, mas antes a de um arrependimento que seja sincero, vindo dos principais partidos, os tais que deveriam promover um novo contrato social voltado para um adequado código deontológico, onde pedissem perdão ao povo pelas degenerescências a que deram guarida. 

Não é solução o habitual truque das campanhas eleitorais. Como a de colocarmos o BPN como o inverso do Freeport, ou justificarmos o cavaquistão com os negócios de Macau do soarismo. Cavaco deveria ser o primeiro a denunciar o cavaquistão e o PS a livrar-se de certas tralhas reais da sua efectiva história. De outro modo, continuaremos a silenciar o caso BCP, correndo o risco de muitos outros BB nos explodirem numa próxima curva do caminho. E entre uns e outros venha o diabo e escolha.

E o presidente da república deveria ser solicitado pela partidocracia para um urgente acto de regeneração. Julgo que a maioria dos dirigentes dos principais partidos está de acordo com a liquidação deste estado a que chegámos. E tal passa mais por uma atitude do que por novas e velhas leis e novos e velhos magistrados...

27.5.09

Um Portugal dos Pequeninos contra a mania das grandezas






Um grande abraço ao João Gonçalves pelo lançamento deste Portugal dos Pequeninos, prefaciado por José Medeiros Ferreira e com apresentação de José Pacheco Pereira. Será no dia 5 de Junho e lá estarei, de qualquer maneira. 


O regresso de um artista português em tempo de queda dos anjos


Toda a  classe política e toda a classe dos homens de negócios ou da futebolítica suspenderam as respectivas actividades, como se tivessem que assitir em directo ao final de um mundial de futebol em que participasse a selecção de Madaíl. Nem uma conversa em família de um qualquer presidente da república teria este "share" qualitativo onde um novo herói ou velho artista português documentou de forma tão expressiva uma sucessão de queda dos anjos.

Lá estou ouvindo Oliveira e Costa, como ouvi Miguel Cadilhe, como ouvi Dias Loureiro, nessas viagens à roda do meu quarto que não foram a descida de Cristo à terra, mas de publicidade de alguns escritórios de advogados especializados em líbios, entre o negocismo dos negócios e as politiquices da política, onde ex-ministros fingem que são banqueiros e bancários assumem o governo. O triângulo simbólico desta imagem a preto e branco é um excelente revelador das presentes circunstâncias, onde o bem tem pedações de mal, tal como o mal, amplas manchas de bem. Mas quem ousar atirar pedradas   às vidraças do vizinho do bloco central, pode chegar a casa e achar as suas quebradas.

Os pés de barro do cavaquistão tornaram-se patentes, mas sem nunca termos visto em directo a terra do leitinho com mel do soarismo, porque não funcionavam da mesma maneira as comissões paralamentares de inquérito aos passaportes, aeroportos e malas com dinheiro de Macau, porque as memórias de rui mateus são infames e de má vingança, embora também por lá o mal tenha tido pedações de bem e o bem se misturasse com financiamento de campanhas eleitorais e belos investimentos em empregomania. 


Reduzir os contonos do BPN a mero assimétrico do Freeport e nivelar os irmãos-inimigos do bloco central de interesses com muitas viagens à terra dos alibábás é não repararmos que a economia real tem muitos contornos de capitalistas à antiga, com pouca ética protestante e muitos bolsos cheios de dinheiro fresco, onde circulam outros tantos políticos e jornalistas desempregados à espera de uma avença. E feitores de ricos, feitos capatazes, ou sonhadores activos de projectos típicos de um Portugal dos Pequeninos com a mania das grandezas, tudo dava um excelente romance de costumes, onde, na primeira parte, poderíamos colocar a ascensão e queda da Universidade Moderna. 

Os capítulos seguintes poderiam passar pela autobiografia de muitas campanhas eleitorais ou pelo sistema de avença de ex-ministros, reconhecendo que já antigamente eram as faculdades de direito que institucionalmente faziam as leis e que, agora, os ministros têm que recorrer a catedráticos em "outsourcing", depois de eles terem sido ministros dos governos que os nomearam, para que o intelectual passe a intelectuário, especialmente se ele for francamente dotado no pagamento de dívidas de campanhas presidenciais. Mas sem deixarmos de incluir sobreiros abatidos e submarinos em águas profundas, muitos sobreiros, algumas companhias de águas, cervejas e refrigerantes colando cartazes de camapanha eleitoral ou magníficas instalações de pias instituições que nasceram de contrapartidas pela deslocação de campos de futebol legados para a regeneração da juventude pelo desporto e a beatice. 

Vale-nos que Jaime Gama, mostrando superioridade, preferiu ir ao mais a sul da república contemplando a reserva ornitológica  que  tornámos sentinela de resistência contra as pretensões do Estado Espanhol quanto a parcelas do nosso mar territorial. Consta que levou textos do mais original dos grupos políticos da presente campanha europeia, os piratas suecos que já contam com oito por cento das sondagens. Infelizmente, não me deixam votar neles...

26.5.09

Europeu e português, assumo a Europa como uma nação de nações



Quem acompanha a política britânica, para além das crónicas de J. C. Espada e dos ataques de fúria de Mário Soares contra Blair e Brown, é capaz de compreender esta imagem. Os direitos dos "Gurkhas" que foram objecto de uma intensa campanha cívica, liderada pela actriz Joanna Lumley, acabaram de ser reconhecidos pelo governo, assim se confirmando como ainda há democracias que se sustentam em decisões morais e patrióticas. Eles elegeram a rainha através do heroísmo dos combates e o povo, representado no parlamento confirmou como está dependente da opinião pública e da democracia da sociedade civil. Porque, sem soldados não há democracia e sem estes símbolos sagrados do contrato social original também não há Europa.

Tinha razão Jean Monnet quando nos avisava quanto à imprescindibilidade do Reino Unido para o lançamento do projecto europeu, temendo as derivas jacobinas da racionalidade finalística que, perdida em tecnocracias de princípios abstractos, nos pode conduzir ao Terror, esmagando a Vendeia, o País Basco, a Catalunha ou o próprio Portugal. Basta lembrar como alguns dos nossos principais actores deste espectáculo eleitoralesco não conseguem captar o essencial daquela racionalidade axiológica que está na base das doze estrelas desta comunidade política supra-estatal e supra-nacional que alguns reduzem a simples análise do custo-benefício de uma qualquer engenharia de fundos estruturais e planos tecnológicos.

Europeu e português, assumo a Europa como uma nação de nações e não como um verme apátrida que, ao unidimensionalizar-nos como súbditos de uma hierarquia das potências, incluindo a das multinacionais partidárias, nos faz esquecer o essencial da racionalidade axiológica, sem a qual não pode haver política. Assumo a Europa como democracia de muitas democracias, historicamente enraizadas, e não como hermenêutica de um qualquer texto constitucional não referendado nem amado que paire sobre as nossas cabeças como papagaio de papel.

Por isso, declaro que sem Gurkhas não há Europa. E recordo como certas facetas da mais recente história portuguesa nos quiseram fazer esquecer os nossos Gurkhas, como , por exemplo, foram os comandos africanos. Porque não há política quando falta o respeito sagrado pela palavra dada, quando se transforma a confiança pública num jogo de péssima retórica propagandística.


A Europa não pode ter um parlamento para onde mandamos os reservistas em regime de prémio de fim carreira, com longas listas de figuras de um museu de cêra. Não há Europa com contabilidades de meros postos de vencimento e  com este ambiente de cedência à empregomania que está a corromper as eleições. Um cabeça de lista acusa o outro encabeçador de nacionalista e reaccionário, quando este proclamou ser o único federalista europeu depois de Mário Soares, e os dois invocam demagogicamente os medos espanhóis, talvez para não nos recordarmos que, na última final da taça do rei, o hino do Estado madrileno foi assobiado insultuosamente pela maioria do estádio, em grande coligação de nacionalismos de Bilbau a Barcelona 

O PS e o PSD, essas secções domésticas da oligarquia multinacional partidária que esmaga a Europa, apenas estão a jogar para o empate, a fim de não descerem de divisão. E apenas nos pedem um cheque em branco, escondendo e enganando os reais programas europeus a que estão submetidos. Gostava mais que me justificassem para que havemos de votar em quem não nos considerou com capacidade para a aprovação do tratado global europeu, através de um referendo. Gostava mais que me explicassem porque faltaram à palavra dada, não permitindo a voz popular nessas matérias essenciais para o nosso futuro. E não invoquem o nome de Cavaco em vão...

Por mim, queria discutir coisas essenciais, como o proteccionismo renascido que nos pode levar a sucessivas falências, porque não é com um qualquer jaime silva ou com um qualquer pinho que resolveremos questões como a quimonda, a auto-europa ou o atentado às leis da concorrências por um governo a comprar bibelots de propaganda. Gostaria também de discutir o exército europeu, a adesão da Turquia, a luta contra a desertificação ou a regionalização, bem como a nossa liderança no processo de relações da Europa com a África ou com o Brasil, para além do Manuel José ter ido do Cairo para os Palancas e de Scolari ter sido seleccionador de Portugal. 

Infelizmente, não há Joanna Lumley, mas apenas uma triste conspiração de avós e netos, com longas teorias de justificação, incluindo as que nos presidencializam. Preferia passar da nação à supernacção futura, transformando a Europa numa república maior, a caminho da urgente república universal, onde o federalismo maior também implica federalizar-nos por dentro, porque qualquer contrato federal com jacobinos centralistas é mero regresso ao Marquês de Pombal e a Robespierre, onde se transformam as nações conquistadas nos fantoches das "républiques soeurs".


25.5.09

Antimaneleiros, uni-vos! A luta continua, temos a Ibéria connosco!



Leio, de Pancho Guedes: continuará a cidade dividida, doente, esquizofrénica? Continuará a cidade traída pela preguiça, estupidez e ganância dos homens ou começará amanhã a cidade a ser a casa grande de toda a gente? O grito de alma deste grande português, esquecido e silenciado, foi suspenso pela comissão de censura, num texto que estava para ser emitido em 9 de Junho de 1963.

Entro no aqui e agora e reparo como foram particularmente mobilizantes os primeiros dias de campanha eleitoral das europeias. O PS, com Zapatero a puxar por Sócrates, foi ao pavilhão do "vai tudo, união de coimbra" procurar fingir que a multidão do povo não se reduz aos dois mil camaradas que a máquina do Largo do Rato levou excusionisticamente a Coimbra. 

Jerónimo esmagou, expressando a sua soberania de rua com oitenta e cinco mil manifestantes, vindos de todo o país, entre o Saldanha e o Marquês, coisa que só os cem mil devotos de Nossa Senhora de Fátima conseguem igualar entre as ruas da capital e as da outra banda. 

Manela preferiu o recato de uns colóquios de alcatifa e "zoom" de telejornal, para uma qualquer frase da noite, conforme a engenharia comunicacional dos respectivos assessores, encenando a coisa com a presença de uma centena de seminarizantes, mobilizados pelo presidente da distrital ou o candidato a redeputado. 

Paulo Portas foi enganado pelas estruturas locais e os assessores: pensou que tinha feira do queijo e não encontrou povo para o teatrinho de campanha do telejornal. Deu barraca que as televisões captaram, para gáudio do Jaime Silva. 

Já o mano candidato, Miguel Portas, preferiu uma alentejaníssima paisagem de palha com um saltinho à feira islâmica e falou da terra, do cosmos e do último livro que publicou, cheio de belas fotografias. Por outras palavras, o momento mais exaltante foi o de Vital Moreira a confessar a sua tentação centrista pelo arroz doce da minha santa terrinha.

Portas Paulo vestiu camisa branca e casaquinho escuro, Melo levou a mesma farda, da direita chic. Miguel Portas preferiu a camisa azul, igual à de Louçã, outra farda do mesmo uniforme, mas do radical chic, da ponta esquerda da mesma ideia de família. Contra os dois lados, só um mesmo grito de dantas, pim!



Apenas concluo como a meritocracia continua longe da partidocracia. Porque o mal está nas pretensas eleites que se assumem como seleccionadoras nacionais do pensamento único. Porque elas sempre se deram mal com a criatividade e a imaginação. Pancho Guedes teve a ousadia de dizer que havia um Portugal lusotropical, vizinho de Durban, onde foi educado Fernando Pessoa. Pior do que isso: concorreu para edificar um grandioso monumento aos combatentes do ultramar, denunciou os massacres da guerra e os generais matadores, mas sem deixar de retratar Samora Machel como ele era, enquanto equiparou o 25 de Abril a um talho e a matadouro, donde se teve que sair para o exílio, para poder continuar a ser livre e artista.

Aqui e agora, Sócrates e Zapatero, apoiantes confessos da recondução de Barroso,  talvez não tenham esquecido que, quando Barroso ainda era chefe de governo de Portugal e já tudo era porreiro, pá, o actual presidente da comissão da UE ainda começou por lançar a candidatura de António Vitorino a esse lugar, coisa que não esteve tremida, porque nove Estados chegraram a ser mobilizados para tal objectivo. Acho que tudo falhou quando o PSOE, com pouca solidariedade ibérica, disse que família socialista por família socialista, o senhor Europa deveria ser Javier Solana. 

Logo, discursos como o de Sócrates, com sotaque chavezista, qual Marinho Pinto contra a senhora da TVI, quando entram em delírio antimaneleiro apenas servem para enganar os papalvos. Por outras palavras, o tédio vai marcando o ritmo politiqueiro, onde, para argumentos fracos, surge a voz forte dos insultos e muitas viagens ao museu de cêra do pós-prec, porque quanto mais insultos, menos política e mais indiferença. Nem o "Manela ponto come" ou o "SOS voz amiga" de qualquer "telemarketing" nos livrarão dos diabos neoliberais e neolconservadores, ditos reaccionários, mas emitidos por quem é qualificado por fascista por jovens artistas.



Preferia uma qualquer lei europeia que só admitisse deputados eleitos se metade do corpo eleitral fosse às urnas. De outra forma, não tardará que venha o estadão admitir em lei que, da próxima, as abstenções contarão como votos a favor, à maneira do referendo de Salazar sobre a Constituição de 1933. Ou, melhor ainda: uma lista única, de adeptos do europeísmo do pensamento único, que seria automaticamente eleita, sem necessidade do povo ir às urnas, nos círculos onde não se apresentassem listas alternativas. Foi o que aconteceu em 1911, nas primeiras eleições da república portuguesa...

Por isso, acabo de desligar o televisor, depois de uma das propagandistas da euro-enegenharia subsidiocrática emitir um programa do novo SNI, onde se proclama que tudo quanto é nacionalista é de extrema-direita. Os meus amigos da Irlanda centrista, da esquerda basca e do liberalismo nacionalista da Catalunha repararam como os portugueses foram ocupados pela estupidez censória de um europês snob das tias de Cascais que estiveram inscritas no MRPP ou no Movimento Nacional Feminino...

Continuará a cidade dividida, doente, esquizofrénica? Continuará a cidade traída pela preguiça, estupidez e ganância dos homens ou começará amanhã a cidade a ser a casa grande de toda a gente?

P.S. Reproduzi dois quadros de Pancho, expostos no CCB. No primeiro, generais contando quantos mataram de um lado e de outro. No segundo, a importância dos olhos. No terceiro, um exemplo do provincianismo euro-situacionista. No próximo comício, Barroso deve ir à Madeira, com Manela e Jardim, em ritmo de Jaime Ramos. Prefiro o lusotropicalismo de quem se refugiou em Colares. O meu imaginário é mais armilarmente malagantana do que socrático, porteiro, jerónimo ou maneleiro. E nem o fato às riscas de rangel me leva a ceder. Gostaria mais de edificar o obelisco de Pancho, onde um poema de pessoa, um risco do arquitecto da casa grande de toda a gente e uma nota descritiva de mia couto nos poderia fazer largar da lama para que continuemos a perfeição do transcendente situado. Entretanto, vou relendo os avisos de Plutarco contra os aduladores...

22.5.09

Do encerramento da Universidade Internacional ao rejuvenescimento da pátria, com Marinetti em antidantas


No crepúsculo desta legislatura, onde todos são campanha eleitoral, o consenso da ética republicana, os acordos do bloco central e o eventual bom senso do arco constitucional não rimam com a original ética republicana, mesmo que ela seja tão monárquica como a do fundador do conceito, um tal Kant. Daí, a novidade parlamentar de hoje: dos 222 deputados votantes, 113 escolheram Jorge Miranda (PS), 59 optaram por Maria da Glória Garcia (PSD), 15 apostaram em Guilherme da Fonseca (PCP) e 16 em Mário Brochado Coelho (BE). Outros 16 parlamentares preferiram votar em branco e três tornaram nulo o seu voto. Serão necessários 148 votos para se atingirem os dois terços necessários. 

Isto é, o único queijo limiano que resta é ou uma traição dos deputados do PSD, ou  aquilo que o mesmo partido sempre exigiu: somos necessários para perfazermos dois terços! Logo, em termos de Pátria Portuguesa S. A. R. L., as acções laranjas, apesar de minoritárias, aumentaram de valor ou são falíveis. Mesmo que, fazendo as contas, tenhamos de concluir que os desviacionistas, os que indisciplinaram a ordem dos directórios partidários, vieram tanto do PS como do PSD. Entretanto, ficamos a saber que Francisco Pinto Balsemão, que daria também adequado candidato a Provedor,  tendo em vista o conceito geracional dominante, passou a representante da sociedade civil na liderança de  mais uma universidade pública portuguesa, emparelhando assim com outro antigo ministro, de quem foi colaborador no antigo regime, e com Henrique Granadeiro, antigo activista do grupo Expresso. Dois dos três desempenharam funções de relevo no decadente ensino superior universitário privado. Espero que não tragam esta última carga para as funções de regeneração e rejuvenescimento que as universidades públicas portuguesas precisam, especialmente quando o país tem, como chefe do governo, um dos bons exemplos criativos que o mesmo ensino universitário privado trouxe ao país. 

P.S. 1. A imagem reproduzida não é pura coincidência, retrata o antigo Vice Presidente do Conselho de Planeamento da encerrada Universidade Internacional,  entidade precursora destas magníficas reformas de Gago, já depois de ter sido ministro, onde o  depois tem a ver com o cargo e não com a imagem junta. Depois do depois é Telecom, Santander, Siemens, Mello, etc. Daria um óptimo Provedor de Justiça, sem ironia. 

P.S. 2. O rapaz da fotografia não é um dos estudantes da António Arroyo que hoje recebeu sem ovos, mas com muita algazarra de instalação, Sócrates, Teixeira e a Maria de Lurdes. Chamaram-lhes, com evidente ofensa para Mussolini, "governo fascista", para rimarem com a reivindicação do artista, mas, num cartaz que a televisão emitiu, podia ler-se um grito de alma: "somos futuristas", com um "viva Marinetti". O tal do "promontório dos séculos" que ainda não havia sido varado pelo "magalhães", mas que era fascista e tudo. Espero que o Ministério não mande mais um inspector  inquirir sobre esta campanha de camisinhas negras anticonstitucionais. Vale mais continuarmos o "manifesto antidantas" que esse era "futurista e tudo". Porque quem semeia ventos de propaganda comicieira em cima da mesa do orçamento do estadão, depois de atirar pedradas pode passar por um pátio e achar as suas proas quebradas, colhendo as inevitáveis tempestades...

Entre a herança de Alexandre Herculano e as saudades de futuro de Fernando Pessoa, com alma mater como pano de fundo


Ontem, o João Gonçalves assinalou, em sentido postal, a morte, há onze anos, de Francisco Lucas Pires, comparando a efeméride com este tempo de nojo que precede a formal campanha eleitoral para mais umas eleições europeias, onde os dois principais competidores são marcados por um antigo companheirismo com o fundador do Grupo de Ofir. Um, com alguns sinais de discípulo distante, outro, como colega na velha "alma mater studiorum". E vieram-me à memória os tristes momentos do funeral do Francisco e das emoções que muitos de nós viveram nos Gerais e no Pátio da Universidade, a que compareceu o colega e antigo adversário político de nós todos, Vital Moreira, num gesto de companheirismo e de nobreza universitária política que o honraram. Lado a lado, com o meu colega de turma Fernando Nogueira, lembro-me dessa viagem pelo tempo perdido com uma intensidade permanecente de encruzilhada criativa a que continuo leal.

Parte essencial da minha biografia intelectual nasceu em "rerum novarum", "ratio studiorum"e "verdadeiro método de estudar" dessa Coimbra da primeira metade dos anos setenta do século XX, ainda sem "dedução cronológica e analítica", quando Vital, apesar da disciplina de um partido estalinista, nos introduzia  na escadaria althusseriana e gramsciana daquele marxismo aberto que o conduziria ao presente pluralismo de pertenças. E quando Francisco Lucas Pires, não rimando com o grupo lisbonense da "Política" e das memórias situacionistas do "Movimento Jovem Portugal",  fecundava os espaços da direita dos anos sessenta com um pouco menos de reaccionarismo, embora, na sombra, pairasse a mestria mental de Rogério Soares e até algumas condescendências do injustamente esquecido Afonso Rodrigues Queiró, que não se esquecia de ter sido discípulo de Luís Cabral de Moncada. Por outras palavras, os políticos que vieram dessa Coimbra, mesmo quando actores em Lisboa, no parlamento, na ministerialidade ou na partidocracia, nunca perderam a raiz de homens de pensamento e sempre se enquadraram, com alguma dificuldade, nos caixilhos das ideologias plastificadas a que o binário maniqueísta do combate político obriga.

Também ontem, mantive uma longa conversa com um jovem ligado a movimentos liberais europeus institucionalizados e ambos reconhecíamos como era difícil escolhermos um dos partidos que agora estão na corrida europeia, entalados que estamos entre o PPE e o PSE, dado que as margens comunistas e bloqueiras nenhuma coincidência têm com a identidade pluralista do ser liberal. Foi uma conversa entre um velho liberal, que terá sempre uma base conservadora, como eu, e um outro jovem, mais da esquerda das causas, que aceita o meu tradicionalismo anti-reaccionário, mais girondino do que jacobino e mais radical de um centro excêntrico do que gazua dos valores identitários de uma comunidade nacional esotérica, como é a portuguesa, onde me continuo a conjugar entre a herança de Alexandre Herculano e as saudades de futuro de Fernando Pessoa.

Por isso também recordo o esforço frustrado de Francisco Lucas Pires, quando pretendeu conjugar, num espaço partidário, as famílias da democracia-cristã, dos conservadores e dos liberais, ele que acabou mais democrata-cristão, mas sem deixar de misturar o conservador e o liberal, num certo estilo de nacionalismo liberal que foi capaz de conciliar com o europeísmo oficial do PPE. Nessa aventura que o levou ao PSD já não participei, embora tenha saudado expressa e categoricamente, em artigo aparecido num semanário da época, o respectivo pedido de demissão de um CDS que se enredava no tacticismo do "Independente". Eu tinha-o precedido no abandono da instituição.

Reparo que esse verme indenpendenteiro, ainda hoje, embora com outros nomes, mas com a mesma farpela capitaleira e radical-chic de direita, está a limitar o espaço de criatividade que, nos primeiros momentos, pareceu manifestar Rangel, antes de se encasular no fato às riscas do "homo partidarius" que procura um empate no jogo entre Porto e Coimbra, para que o PSD não desça de divisão.


21.5.09

As saudades do avô tirano e os micro-autoritarismos dos mandarins, onde há mais papistas do que o papão


Estive há pouco aos microfones da TSF a comentar a crise de lideranças em Portugal. Comecei por salientar que a tal liderança não é uma qualidade pessoal, mas antes a interacção do líder com determinadas situações sociais, pois as mesmas qualidades pessoais podem não servir para outras circunstâncias de tempo e de lugar. Barroso, um péssimo primeiro-ministro de Portugal, tornou-se num óptimo presidente da comissão europeia, tal como um bom autarca ou um bom professor podem dar uns péssimos ministro. 

Acresce que as lideranças políticas  pouco têm a ver com lideranças futebolíticas ou até com lideranças do mundo dos negócios e que confundir os plano pode levar ao desespero de comparações, onde quem busca homens providenciais pode provocar uma rifa donde nos sai um Valle e Azevedo ou um Zé dos Bigodes. Assim, nesta encruzilhada de decadência, quando insensivelmente andamos em busca dos tais homens providenciais e carismáticos, quando criticamos o vazio de líderes,  contribuímos para a eleição de Salazar num concurso televisivo ou criamos um saudosismo, onde voltam outras lideranças políticas fortes dos últimos trinta anos.

Quase não reparamos que foi o pós-autoritarismo face ao avô tirano que gerou situações psicológicas de confiança face a outras personalidades, como foi a de Mário Soares, o pai bonacheirão da democracia que com as suas bochechas tranquilizantes nos livrou das tensões do PREC, sem recurso aos antidepressivos. E, em seguida, quando já estávamos mais calmos, procurámos uma liderança contraditória, a do tio Aníbal que, nos seus tempos áureos de construção do cavaquistão dos homens do sucesso, apareceu como o gestor implacável com alguns tiques de autoritário, típico de um tempo de "enrichez vous", onde uma personalidade incorruptível não cuidava de escolher as mesmas qualidades nos seus ajudantes ministeriais, como agora se pode comprovar.

De qualquer maneira, nesta sociedade, ainda com marcas pós-autoritárias, sobretudo face à manutenção dos subsistemas de medo,poucos compreendem que a ditadura foi um período de suspensão da política, onde o chefe governou a república como o pai governava a casa, como o patrão comanda a empresa, misturando a violência e a opressão com a coerção muda. Isto é, vivemos em paternalismo, essa forma de controlo de um país ou de um grupo, onde os que mandam tratam os dependentes como os pais tratam os filhos nos modelos de família tradicional. 

No plano político, equivale ao despotismo, quando o chefe político governa a república como o dono trata da casa. No caso concreto da gestão de empresas, quando o patrão trata os empregados apenas com piedade e condescendência, não admitindo a institucionalização dos conflitos nem o recurso à ideia de justiça, nomeadamente visando o estabelecimento de acordos e negociações entre empregadores e trabalhadores entendidos como categorias colocadas num plano de igualdade contratual. 

É então que emerge o déspota que, etimologicamente, significa o chefe da casa, em grego (oikos despote). Equivale ao dominus grego (o chefe da domus), donde vem o nosso dono. O radical potes origina em latim potens, potentis, donde vem potentia. O despote é aquele que tem omnipotência, plenos poderes sobre os que dele estão dependentes. Tal como o seu sucessor, o paterfamilias  romano, com direito de vida ou de morte (ius vitae necisque) sobre os membros da família extensa que comanda. Equivale à ideia de patrão omnipotente ou de pai tirano. E a ideia regressa sempre que o chefe político trata de gerir o espaço político como se este fosse uma casa ou uma empresa, onde desaparecem os cidadãos, participantes na decisão política, e todos se transformam em súbditos ou dependentes. Degenerescência da política que esquece aquele dito de Plínio, dirigindo-se a Trajano, segundo o qual inventámos o príncipe, a política, para deixarmos de ter um dono.

É evidente que muitos chefezinhos políticos de hoje ainda procuram disfarçar-se com velho modelo do  despotisme éclairé, proposto pelos enciclopedistas e que tem como antecedente a ideia de governo da ciência de Francis Bacon. O tal modelo que foi também assumido pelos fisiocratas, quando estes distinguiam o desejável despotisme légale do mero despotisme arbitraire, conforme terminologia inventada por Mercier de la Rivière. 


19.5.09

Contra o federalismo neojacobino de uma assembleia única


Porque me acordo quase sempre nas vésperas antigas, entre as quatro e as seis da manhã, raramente consigo apanhar as televisivas ou internéticas emissões que aquecem por volta da meia noite. Não, não estou a referir-me às abstracções de Gianni Bertini, aparecidas em 2004, mas  talvez à tertúlia de ontem, com um ilustre candidato a deputado europeu que, muito à cabeça de lista, se disse federalista à maneira de Mário Soares, qualificando os dois como os únicos que assumem tal posição, mas justificando tal atitude pela defesa de uma constituição europeia, a emitir por uma assembleia europeia constituinte. O senhor candidato, que também ontem se assumiu como cristão progressista, por causa do apoio que dá a um sucedâneo de casamento para os homossexuais, não sabendo também se chegou a assinar a ficha de militante do CDS, por causa do apoio que prestou a Lobo Xavier, está no seu direito de entender a Europa dessa forma neojacobina de baptismo catolaico, mas talvez deva admitir que o mundo das ideias é bem maior do que o espaço do respectivo conhecimento paroquial. Chamo-lhe neojacobino não doloso, porque ele não se eximiu na adjectivação fácil de estalinista, para com um meu antigo professor.



Por outras palavras, pode haver um tertium genus europeísta, um pouco mais girondino do que os frequentadores do clube de Saint-Jacques: os que, não dormindo, como o frère, são federalistas e nacionalistas, repudiando o velho soberanismo e o mais antigo estatismo. E estes podem gostar mais de uma Europa como "nação de nações" e de "democracia de democracias", não admitindo assembleias únicas de unidimensionalizado figurino, como nos é imposto por esta oligarquia partidocrática transnacional e quase apátrida, para recordar verbosidades certas de De Gaulle, quando procurava o "oui par le non", em defesa da Europa Decadente. Apenas espero que os incautos, em nome do ódio a Vital Moreira e a José Sócrates, não passem um cheque em branco ao mesmo tipo programático de certo PS, não seguidor das teses de autodeterminação nacional, sempre perfilhadas por Manuel Alegre. Quando a música celestial da espuma dos dias nos faz elevar ao mais do mesmo, entre o PS e o PSD, prefiro continuar a ler Boris Vian. Espuma por espuma, prefiro a das ondas e, de tantas rasteiras de palavra solta, ainda nos vai sair a vitória do Vital. A Europa nunca se fará de um golpe, pai-fundador o disse, ou com a técnica da assembleia dos comprados por Bismarck...

Contra a Europa dos emplastros, saudades do José Pacheco Pereira...


Entre Marinho Pinto e Nuno Melo, eis o espaço da presente dialéctica lusitana que passou a caber quase toda num desses cenários analíticos de Marcelo Rebelo de Sousa, com a angústia de termos de decidir entre Jorge Miranda e Maria da Glória. Sócrates responde com dez quilómetros de "cross" pelas novas oportunidades e o cardeal D. José Saraiva teoriza sobre o conceito bíblico de "rex", enquanto as jotas discutem a distribuição gratuita de camisinhas nas escolas e Manuela Ferreira Leite fala na incompetência total de Jaime Silva e no país enxovalhado pela manutenção de Lopes da Mota num qualquer departamento de europolícia, de que o povo europeu nunca ouviu falar.


Vital Moreira pode ter razão quando fala dos fantasmas que ensombram as outras listas e, por mim, bem gostaria de um frente a frente entre Ana Gomes e certos emplastros que espreitam no ombro de Rangel, incluindo uma ilustríssima ex-ministra educativa do pior que teve o barrosismo, coisa que seria estimulante se viesse a ser glosada pelo movimento dos blogueiros meus amigos que fazem, dela, doutros e doutras, as pretensas andorinhas que anunciam a primavera da regeneração democrática. É que se fosse obrigado a votar entre as duas preferia naturalmente a Ana, sem ironia, lembrando-me de Timor e da boa acção que a levou justamente a nossa representante libertadora. Tenho divergências com o socratismo, mas não teria dúvidas em votar num PS liberto dessa tralha contra um PSD que nos trouxesse de regresso o anedotário do cavaquismo, do barrosismo e do santanismo. Estou convencido que ainda um dia voltarei a votar útil nesse PS.


É por isso que não me revejo em certa direita das classes A e B que tem muito do estilo "Independente", mesmo que se vista do neoporteirismo do recente PSD que, infelizmente, parece ter enredado Rangel, depois das primeira aparições do mesmo, ainda marcadas pela autenticidade tripeira. Agora é só consultores de imagem para um novo penteado e marcadores de "agenda setting", correndo assim o risco de se transformar em mais um dos plastificados agentes da seccção portuguesa dessa multinacional partidária chamada PPE, a tal que também já pintou de moderação aquele minhoto que "não queria brincar aos políticos".
Por outras palavras, as eleições europeias ameaçam transformar-se num desses debates controlados à distância, onde talvez fosse mais curial fazerem uma espécie de lista única dos debatentes e comentadores que as agências de Bruxelas costumam remeter para as escolas no dia da Europa, onde Ana Gomes se poderia chamar Teresa de Sousa e o Paulo Rangel, Paulo mas Sande, enquanto Nuno Melo receberia discursos do professor Fausto Canuto. Por outras palavras, não será nesta campanha que vamos discutir política para além da retórica bismarckiana ou habsburguiana dos que nos tratam ao nível dos PIGS, onde deveria ler-se SIGP, ameaçando com heresia os eventuais maus-feitios dos que não se enquadram no molde. É por isso que tenho alguma saudade da rebeldia que, no PSD, demonstrou o José Pacheco Pereira...

18.5.09

Sobre os caçadores de satânicos, demoníacos, maçónicos, pentescostalistas, bruxas e budistas



Como crente que vou sendo, e cada vez menos ateu e menos agnóstico, nada posso ter de anticatólico, antiprotestante, antijudaico, antibudista ou antimuçulmano, mesmo que me reconheça como não adepto da religião dominante em Portugal. Bem pelo contrário! As grandes religiões universais, sobretudo em momentos de cepticismo pouco entusiasmante, são fundamentais para que o fundamentalismo não nos faça tropeçar nas encruzilhadas da decadência.

Daí que, ontem, tenha espreitado, com toda a naturalidade, a participação do nosso Fidelíssimo chefe de Estado nas comemorações, procissões e missas do símbolo escultório que o Cardeal Cerejeira colocou na outra banda, saudando, em especial, a postura de reconhecimento popular que a presidente comunista da autarquia almadense assumiu.

Reparei que o senhor duque de Bragança foi transformado por Fátima Campos Ferreira em comentador de assuntos religiosos, mas que o Bispo de Setúbal teve o diplomático cuidado de silenciar referências à relação da dinastia que lhe dá nome com o culto mariano, certamente para não irritar a comissão oficial das comemorações do 5 de Outubro de 1910.

Invocar a aliança do trono e do altar, anteriores a 15 de Maio de 1891 seria tão politicamente incorrecto como homenagear D. Manuel Gonçalves Cerejeira e o seu grande aliado António de Oliveira Salazar, até porque os organizadores das cerimónias de ontem e de anteontem, tão justamente transmitidas em directo pela televisão pública deste Estado laico, não quiseram correr esse risco. Seria quase tão ofensivo quanto montarem uma banca onde poderiam colocar o "Diccionario Enciclopédico de Sectas" organizado pelo dignitário espanhol do Opus Dei, Manuel Guerra Gómez, especialista na detecção da dita "versão maçónica da Ordem de Malta", bem como no inventário das vinte mil seitas que inundam a ortodoxia, segundo o conceito da Universidade de Navarra, com os consequentes processos difamtórios em tribunais do Estado Espanhol de hoje.

Temo que, do reino da Casa de Áustria, nos voltem a exportar conceitos como este: “uma seita é a chave existencial, teórica e prática dos que pertencem a um grupo autónomo, não cristão, fanaticamente proselitista, exaltador do esforço pessoal e da expectativa de uma mudança maravilhosa, colectiva - da humanidade - do indivíduo ou do homem em uma espécie de super-homem".

Temo que os neotorquemadas aqui se estabeleçam com a respectiva Rede Ibero-Americana de Estudo das Seitas (RIES), para concluirmos guerraticamente que a “nossa época, não menos do que outras e talvez mais que outras, merece apelidar-se demoníaca”. Daí que possam aparecer os habituais caçadores de satânicos, demoníacos, maçónicos, cismáticos, heréticos, pentescostalistas, bruxas e budistas, em nome de um pretenso científico catedrático, assente num qualquer Doutor em Teologia patrística e em Filologia clássica, capaz de concluir pelas vias que nos levam à “busca desenfreada do prazer sexual” ou às "relações peculiares com o Demónio”, bem como à detecção dos praticantes de "el yoga, las artes marciales (aikido, reiki, taichi, etc.) y, sobre todo, el zen, han sido el caballo de Troya que ha facilitado la introducción camuflada del budismo en Occidente".

Por mim, continuo a reler o processo do Padre António Vieira perante a Inquisição, a ser fiel a Damião de Góis e a preferir Erasmo a Lutero, embora subscreva Fernando Pessoa. Contudo, não deixo de reconhecer que o livro minhoto-coimbrão "A Igreja e o Pensamento Contemporâneo", de 1924, precede, numa década, o "Caminho" de São Josemaria Escrivá. Para bom entendimento de certa ortodoxia editorial, estas palavras esotéricas devem bastar. Compreendo a causa profunda das vergastadas saneadoras que me dão no lombo certos vendedores de santinhos e sanbentinhos. Para mim, Manuel Guerra era o nome do meu reitor do liceu de Coimbra, o "pulga" de que todos temos saudades, mas que antes da guerra tinha santos de baptismo. Mas esse era professor de matemática e nunca foi editor-mor da ACTIC...

16.5.09

De como Alegre não quis ser vencido na estreiteza dos campos de Alfarrobeira. Os povos continuam disponíveis para a restauração da república


O socialismo social-democrata cá dos reinóis vai reconhecendo a verdade do meio milhão de desempregados, acrescentando que, apesar de se esquecer dos números na algibeira do casaco, a situação é menos má do que a média da União Europeia, onde, embora estejamos na cauda das igualdades sociais, sempre temos belas vistas, olhanenses, olhos à belenenses e boas vistas que perderam as estacas dos loureiros a dias. Vale-nos que os primos do primeiro já conseguem que o expresso volte a dar notícias, fingindo poses de kungfu, quando o sobrinho do tio foi semear magalhães para o jardim do colombo, sem levar vitais nem vitalinos. Por outras palavras, a encruzilhada continua, a situação resiste e a pátria inteira vai continuar a ouvir prédicas de marcelo ao domingo, reprédicas de vitorino à segunda e entrevistas pimba todos os dias, nesta gerontocracia onde manda quem gosta de passar as horas a substituir missinhas por visitas quotidianas aos ginásios de fisiatria, onde reformados, aposentados e pensionistas pensam que ainda podem subir a coqueiros, como se as águas do rio da vida passassem duas vezes no mesmo sítio e da mesma  maneira.

Por isso, importa saudar a coragem de Manuel Alegre que, contra muitas previsões, cumpriu a palavra. Primeiro, veio dizer-nos que o PS não se reduz ao Partido de Sócrates, mas que não está disposto a substituir Jaime Gama no parlamento nem António Vitorino na RTP, dado que não se vislumbra como equivalente a Marcelo Rebelo de Sousa e prefere missão mais metapolítica: a de vencer os aparentes ideias conjunturais das sondajocracias, passando para a eternidade do respeito e da confiança públicas. Daí que ele também não tenha optado pela via estreita de um novo partido que o encarcalharia em aparentes retóricas de uma qualquer ideologia de pacotilha. Por outras palavras, Alegre manteve a autenticidade do poeta, a confiança na palavra e a esperança numa eternidade, quando ousou continuar a viver como pensa, sem ter que pensar como depois vai viver.

Daqui a alguns anos, ninguém se lembrará das retóricas comicieiras ou comentaristas das nossas carpideiras frustradas que nos enredam em velhices do restelo, para uso de uma gerontocracia  que continua a brincar aos assassinatos morais, típicos da conspiração de avós e netos, onde os jotas são usados para o jogo sujo dos que continuam a rebentar com as bonecas, para verem a palha que elas têm dentro. Isto é, Manuel Alegre, que recentemente estudou o drama do Infante D. Pedro, não deixou que os devoristas que se escondem atrás dos netos de D. João I, o levassem para o desastre de Alfarrobeira, dado que compreendeu que nesse campo ele perderia a natural aliança com as tropas populares do partido dos concelhos, conforme continua a ser exigido pela lei fundamental do reino, contante do discurso de João das Regras nas Cortes de Coimbra de 1385, essa constituição originária que nos deu 1640 e 1820, mas que os contitucionalistas de hoje esqueceram.

Em tempos de regafobe, é bom que os devoristas se devorem uns aos outros, para que os resistentes do "polla ley" e "polla grey", conservem o projecto armilar de passagem do Cabo das Tormentas, mesmo que venham a morrer tentando. Os que têm a fibra multissecular de uma palavra que continuamos a passar, de segredo em segredo, sabem que a espera tanto é esperança como é esfera. Basta que a estratégia volte a dar força ao poder-ser.

É evidente que não iria com Alegre para Alfarrobeira, donde aliás poderia sair com a aparente vitória de uma corte reforçada de quinze ou vinte deputados que hoje estão certamente tristíssimos. Alegre é republicano e muitos como eu continuam realistas. Alegre é da esquerda socialista e muitos como eu não são socialistas e, face a esta esquerda, até continuam a dizer-se de direita, embora estejam muito à esquerda da direita cavaqueira e marcelosa, bem como da própria esquerda vitorina ou vitalina. Contudo, os que não vêem, na esquerda contra a direita, uma mera forma de hemiplegia mental, podem superar a estreiteza de horizonte dos sectários e preferem a autoridade ao poder, e a ideia às ideologias. Sabem que vencer pode significar o mero ser vencido, porque nem sempre tem razão quem vence, quando importa ganhar saudades de futuro. Obrigado, Manuel Alegre. Ainda há povo que pode restaurar a República. "Alfarrobeira é uma batalha que não acaba nunca".

15.5.09

O que pode-ser tem muita força, quando, depois do querer de Deus, o homem sonha e a obra vai nascendo


Ontem, ao fim da tarde, na Estrada das Laranjeiras, no auditório da Embaixada do Brasil, entre bons amigos brasilienses, como o Professor Moniz Bandeira, e portugueses do Portugal de Sempre, com destaque para o Mendo Castro Henriques e os lançadores do IDP, tive a honra de poder expressar o meu amor lusíada e de dissertar, um pouco provocatoriamente, conforme a qualificação do moderador, General Garcia Leandro, sobre essas pluralidades de pertenças que podem pilotar o futuro dos povos que pensam, amam e falam na língua de Camões, Pepetela, Mia Couto e Manuel Bandeira. Aliás, o meu general, até começou por invocar o facto de uma das filhas ter nascido em Macau e a outra em Dili, tal como eu invoquei meu nome fenício, de um avoengo oriundo da ilha dita refúgio, Melita ou Malta, provindo de uma emigração do século XVIII, onde a maioria da família nem se estabeleceu na Lusitânia, dado que logo passou para o que era então a América Portuguesa.

Confesso que sou pouco dado a colóquios, seminários e conferências, sobretudo as que servem de tacos para "papers" e outras miudezas que enchouriçam os "curricula". E raramente uso o argumento de alguns que dizem ter escrito cinco livros sobre Angola e participado em colóquios em não sei quantas capitais europeias. Gosto mais de dizer que residi, para além da fase turística do "veni, vidi, vinci", aprendi e ensinei em universidades e centros de estudo luso-chineses, angolanos, timorenses, brasilienses, moçambicanos e guineenses, sentindo a terra e o infinito dessas noites lusotropicais, isto é, experimentando aquilo que apenas alguns julgam na super-estrutura do livresco ou do seminaresco. Abraço armilar é do navegar é preciso...

Por isso, recordei os velhos projectos de um triângulo estratégico de um Atlântico maior, de um Índico de saudade e de um Pacífico armilar, em íntima aliança com os nossos irmãos hispânicos, da UE ao Mercosul, tentando reprimir certos discursos de justificação do situacionismo lusitano, mistos de neocolonialismo de preconceito e de verbosidades retóricas gerontocolonialistas. Por isso, advogo o eixo que vai de São Paulo do Piratininga a São Paulo de Luanda, como base de poderio para uma CPLP que, além dos afectos dos eternos Estados Unidos da Saudade, tem de ter estratégia, isto é, tem de evitar que as potencialidades se transformem em vulnerabilidades e que as vulnerabilidades se volvam em potencialidades. Daí que a prova de vida de futuro passe pela resposta que todos os CPLPs devem dar a Timor Lorosae, essa pátria de poder-ser que nos voltou a dar sonho, quando o David dos cem guerrilheiros teve um povo aliado em aliança de libertação, contra o Golias de um Exército invasor e ocupante que ocupou o nome de um povo amigo e aliado. Logo, todos os CPLPs têm de fazer com que o Brasil não se esqueça da sua função liderante desta comunidade de sonhos. Porque o que pode-ser tem muita força, quando, depois do querer de Deus, o homem sonha e a obra via nascendo. O telegrama da Lusa sobre o colóquio, apesar de injustamente me destacar, revela apenas um dos ramos da árvore daquela floresta por onde ontem peregrinámos

P.S. (Telegrama da Lusa, em sic): Para José Adelino Maltez, professor do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), o primeiro problema é a falta de meios da CPLP, mas Portugal também tem um papel em alimentar uma "nova visão do Brasil sobre a África".  Segundo ele, os portugueses devem aceitar a dar primazia aos brasileiros, "colocando-se no seu devido lugar para poder melhor servir um projeto maior". "Somando 200 milhões de brasileiros, com os futuros 50 milhões de angolanos e os futuros 20 milhões de moçambicanos, nós [Portugal] somos um “entrepostozinho” do sul na Europa”, afirmou o professor. Além disso, Maltez acrescentou que “temos de rever toda a nossa maneira de pensar, como foi expresso de maneira lamentável por todas as reticências em relação ao acordo ortográfico". "Parece que não se percebe que [a CPLP] não são os Estados Unidos da Saudade. É a pilotagem do futuro no balanço da globalização. Basta perguntar quanto gasta cada país da CPLP no orçamento", afirmou o acadêmico. Apesar das dificuldades, "estamos condenados ao regresso de algum triângulo estratégico Luanda-Lisboa-Bahia/Rio de Janeiro/São Paulo" e o Brasil "tem um papel de destaque" na cena internacional, até porque quando "fala forte nos palcos internacionais está a representar-nos a todos", afirmou.


P.S. (D). Pela noitinha, lá tive que aturar mais um debate, agora na TVI, dos cabeças de listas às europeias, certamente subsidiado pela central negra do movimento pela abstenção, porque também eu fiz "zapping", ao confirmar que o melhor continua a ser o Miguel Portas. Só que caí nas declarações de dois ministros do presente governo sobre uma boca de um recluso turco que disse querer pedir a nacionalidade portuguesa por causa do terceiro segredo de Fátima. Luís Amado foi incisivo e esteve muito bem, quando isse que já não há nada que o surpreenda. Silva Pereira confirmou o anedótico quando aproveitou o sensacionalismo para tempo de antena onde, mais uma vez, meteu a palavra na poça da picareta oficiosa. E na espiral do hiperinformativo e do propagandístico, até foi dito que o terrorista e papicida cometeu o crime nestes reinos do aquém-mar...


14.5.09

Algumas cenas do presente salazarismo dito democrático, em ritmo de pá que já não é porreiro


O estilo dos debates quinzenais no parlamento, nesse pugilato verbalístico de um divino Sócrates contra tudo quanto é diabo oposicionista, onde o clímax foi o regresso do "pá", mas pouco "porreiro", depois das rasteiras de Rangel, pouco iluminou os atalhos sombrios que nos conduziram à presente encruzilhada, onde, apesar de todos saberem escrever as frases que hão-de salvar Portugal, nenhum conseguirá salvar mesmo Portugal, dado que voltámos à rotina de uma decadência e da falta de autenticidade. Aliás, os irmãos-inimigos da social-democracia e do socialismo democrático, onde escasseiam os nobres fundadores do regime e abundam os fidalgotes que delapidam a herança, gostam de mascarar-se da rábula do senhor contente e do senhor feliz, adorando que se discuta o regresso do Bloco Central. Acresce que também Portas (Paulo), tal como o PCP e o Bloco de Esquerda são unânimes interesseiros quanto a esse "agenda setting", o tal que dá ilusões ao comentarismo político quanto à salvação do sistema por estes actores da presente partidocracia. Contudo, quem põe o regime acima destes bonzos, endireitas e canhotos e equaciona como altamente provável a impossibilidade do PS atingir a fasquia da maioria absoluta, começa a espreitar cenários que se aproximam do actual estado de coisas na República Checa.

Qualquer observador minimamente atento da nossa história partidária é capaz de compreender que o Partido Socialista não vai acabar se o Licenciado em Engenharia José Sócrates for forçado a pedir a demissão da liderança, se assim o povo o ordenar. Não porque ele corra o risco de ser substituído por Manuel Alegre ou por António José Seguro, mas antes por uma conjugação de esforços que livrem o partido de tipos como Carlos Candal, José Lelo, Augusto Santos Silva e outra tralha socrática, mas sem a habitual síntese cangalheira, como a que poderia receber o nome de Jaime Gama. O PS tem suficiente energia para escolher uma personalidade pouco ávida da personalização do poder e capaz de gerar confiança representativa tanto da respectiva ala esquerda, como da maioria de militantes pouco dados ao negocismo. Basta que esse servidor da ideia de obra consiga poder ser primeiro-ministro num governo de acordo interpartidário com o PSD e o PCP, dado que Portas deve ser condenado a escolher o caminho marginal do Bloco de Esquerda, por serem quiméricos os resultados eleitorais mínimos que lhe permitiriam negociar um acordo de maioria com José Sócrates.

Por outras palavras, a partir de Outubro, a democracia portuguesa vai ter resultados eleitorais que a forçarão à procura de uma regeneração que nos livre da demagogia eleitoralista de leis feitas à pressa, onde tanto se procura a criminalização do enriquecimento ilícito, como, no dia seguinte, se permite a imagem do deboche no financiamento partidário. Assim, quando alguns dos nossos companheiros de blogosfera, coerentes no seu anti-socratismo primário, logo se volvem em seguidistas dos bons sinais de mudança vindos do PSD, cá por mim continuo a não estar disposto a passar um cheque em branco a quem ainda não pediu perdão ao povo por ter sido causas dos mesmos vícios que agora cantarola contra o PS. Basta assistir a uma charla de Ângelo Correia, a um discurso de Alberto João ou a um choradinho de Manuel Dias Loureiro, para concluir que algumas andorinhas como Rangel ou certos discursos de Manuela Ferreira Leite ainda não são suficientes para medalhar com confiança um partido que continua a proibir a expressão da vontade popular, nomeadamente num referendo sobre as determinações que a multinacional do PPE impõe à autodeterminação portuguesa.

Do PP (Partido Portas), não vale a pena falar: basta a comparação com a energia do PCP e do Bloco de Esquerda. Os porteiros nem sequer conseguiram a autenticidade dos discursos de alguns bispos sobre a crise social e a crise da globalização, perdidos em causas como o securitário e o chauvinismo doces, de que os primos do Bloco Central logo se proveitarão quando acharem conveniente. Até nem conseguiram fazer uma justa defesa da ética do capitalismo democrático, porque cederam ao oportunismo do liberalismo a retalho, subscrevendo a cobardia daquela economia mística e salazarenta que gosta de privatizar os lucros e de socializar os prejuízos. Paulo Portas, o tradutor para português de Novak, esqueceu-se das fichas que então o doutrinavam, quando as associações católicas de empresários tentavam traduzir em vaticanês a ética protestante do capitalismo.

Aliás, ainda ontem ouvia o Professor Fernando Rosas, mantendo a sua coerência de marxiano, sublinhar que a esquerda autêntica era o último reduto dessa abstracção chamada Estado, contra os malefícios do mercado, emitindo um discurso que, sem ser de esquerda ou de direita, seria o mais próximo daquele que um Salazar renascido emitiria e até ultrapassaria, denunciando "a fina flor da plutocracia". Julgo que quase todos os situacionistas de esquerda e de direita não reparam que o Estado a que chegámos já não é apenas o Estado da República dos Portugueses, porque, aqui e agora, a maior parte dos factores de poder já não são nacionais, havendo uma pluralidade de estadualismos, grande parte deles incaptável pelo dever-ser dos constitucionalistas. E não é a regulação estadualista dos portugueses que consegue colmatar a lacuna do vazio de Europa e da falta de uma urgente república universal capaz de controlar a geofinança e a geo-economia.

Por mim, que sou liberal e, como tal, defensor de um público e de um político mais eficazes, não situo essa necessidade de distribuição da justiça apenas no fantasma do Marquês de Pombal, de Fontes Pereira de Melo, de Afonso Costa e de Salazar. A regulação que nos falta não cabe no parlamento português, no governo português ou no presidente português. Precisa deles, mas situa-se na supra-estadualidade que só culturas políticas pluralistas, poliárquicas e fedralistas conseguem captar. Tentar matar elefantes com fisgas é gastar energias desnecessariamente. O Estado português é pequeno demais para os desafios da presente crise e utilizá-lo como grande demais para que se esmague a autonomia da sociedade civil é remar contra o tempo e liquidar a hipótese de uma pilotagem do futuro.

13.5.09

O subscretário da propaganda e turismo da ditadura não diria melhor!


Não, não vou dizer nada sobre Lopes da Mota, sobre os meandros Felgueiras, sobre o Eurojust... Vou dizer sobre o subliminar do discurso do senhor bastonário que, ontem, ao ser questionado sobre o Mota e sobre o Palma, alcançou o nível de Vitalino, porque também Vitalino, ao não dizer nada, como de costume, enquanto porta-voz do PS, fugiu-lhe a boca para o que efectivamente o situacionismo pensa e se fosse o subsecretário de estado da informação de Marcello Caetano melhor não diria: malandros dos partidos! 

Porque o ministro, o porta-voz, o provedor das empresas de trabalho temporário estão onde estava o marquês e o pina manique: estão por cima, são de cima. Contudo, até estão acima do que era a "alteza" dos processadores, dado que atingiram o impune da "majestade". São um ponto geométrico soberano que paira como satélite abastracto na estratosfera, ensombrando a planície dos súbditos, esses unidimensionalizados opositores a quem vamos dar o nome odiado de "os partidos". Porque nós, PS, nós, os do Sócrates, os do Alberto Costa, os do Lopes da Mota, nós somos o Estado. E o que nós dizemos tem valor de lei. E nós até estamos dispensados da própria lei que fazemos. Nós e os nossos representantes é que podemos processar e nenhum dos nossos agentes pode ser processado. O Estado são eles, o "lui", os que passaram para o mandarinato, esquecidos que em democracia o Estado devíamos ser nós, a república, a comunidade, porque os cidadãos inventaram a política para deixarem de ter um dono e apenas entregaram aos ministros, aos deputados e ao porta-voz, um depósito, um "trust" transitório, mantendo o poder original da revolta.

Resta saber se o espelho invisível do amiguismo pode apagar todos os vestígios desse corta-fogo discursivo, para que Pilatos continue a lavar as mãos com os falsos credos maquiavélicos do arrependimento do sim-senhorismo. Os donos do poder parecem esquecer que a democracia não é sabermos quem manda, mas como é possível controlar o poder dos mandarins, dos que pegam na mesa do orçamento e convidam certos opositores para comensais, transformando inimigos de ontem em aliados de hoje, para que os aliados de ontem que passaram a dissidentes ou a opositores possam ser devidamente processados no caso de usarem o discurso da racionalidade contra as notas oficiosas do chefe e dos respectivos porta-vozes. Prefiro continuar a ouvir o Amália Hoje, sem discos riscados...