Sobre o tempo que passa
Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...
31.5.10
28.5.10
A valsa que somos obrigados a dançar pelos credores internacionais
Uma travessia no século: bom dia pé! De Teresa Vieira
Uma travessia no século: bom dia pé!
Quando o messianismo desaparece pode-se reconhecer também o quanto África pode ser o futuro.
O continente da fome e das feridas abertas a muitas indiferenças do ocidente, pode auxiliar também a democracia, inclusive para que esta sobreviva às ilusões e, quem sabe, se a essência dela poderá encontrar os seus mais fecundos fundamentos, na legitimidade que África pode ter com os benefícios da mola desta forma de exercício do poder.
A contribuição de uma nova África para com as sociedades também sem tranquilidade histórica, não obstante as aparências, pode mostrar-se o preenchimento de uma falta universal que é a da solidariedade real
A bofetada de luva viria da Africa-Mulher-Mãe de Consistência. Viria de um povo pouco escutado e só visto a bater-se e a morrer em campos minados e nunca desvitalizados de um poder à escala mundial.
Em África o potencial de reivindicação dos povos é impressionante e não pode perder-se numa violência que contradiz os direitos que muitos anseiam ver concretizados.
Tenho para mim que África é um foco de universalidade e de universidade, no sentido de que constitui um futuro que pode emergir numa sensibilidade ao direito que é, sem dúvida, índice de um pensamento universal.
Não pode África, neste papel nuclear de potenciar passagens de futuro, compactuar com as rotas do dinheiro fácil, abertas sem fronteiras à destruição e anulação dos próprios povos.
Em África o pão e a culpa desmentem a igualdade no tratamento humano, mas África, a África rica, pode espalhar-se pelos seus filhos e em qualquer mundo num manifesto alternativo.
Cremos que o futuro da humanidade não passará tanto pelas novas descobertas científicas, mas sim pela utilização do já conhecido ao serviço de todos.
Só as sociedades alienadas se resignam àquilo em que a tecnologia as transforma. Assim é tempo de ajudar os homens a reencontrarem-se e a construírem um futuro à sua medida. É tempo de pararem as explosões sociais incontroláveis que apenas se impõem pela violência.
Talvez que Portugal possa ser uma síntese de esperança se compreendeu a falência das planificações centralizadas ou a opressão do consumismo apesar da utilização maniqueísta dessas duas realidades.
Camus, Lefort, Merleau Ponty, Levi-Stauss, Castoriadis, todos eles sacralizaram as revoltas, mas em verdade se diga que acima desta perspectiva se encontrava o levar o homem à construção do grande caminho inacabado.
É neste sentido que se refere a síntese da esperança que acima se mencionou.
É necessário também que África se recorde do Portugal de hoje e que ofereça sem raivas, a medida em que as aspirações de um mundo similar nos une e, reconheça também o continente africano, o quanto tem sido co-responsável por rupturas suicidas e pela destruição inútil de milhões de seres humanos.
Não basta propor o sol, o vento, o mar. O mundo não pára como um relógio nos entretantos das reparações de que carece.
O sentido do tempo e do instante fazem a diferença entre evolução e ruptura.
Recordo Kafka:
Os leopardos invadiram e beberam o vinho dos vasos sagrados. Esse incidente repetiu-se com frequência. Por fim, chegou-se a calcular, de antemão, a hora do aparecimento das feras. E a invasão dos leopardos foi incorporada ao ritual.
Todos somos chamados às responsabilidades, e sobretudo os celestiais seres da perfeição, aqueles que se colocaram à margem dos erros cometidos. E foram muitos, diria mesmo que sobre esses nem os juízos de valor cuidam em horas de férias.
O grande esforço de libertação é o de nos libertarmos do medo à liberdade.
Agora mais do que nunca, deve surgir também um Brasil alternativo, generoso, imaginativo, um Brasil que não marginalize o próprio povo, que não se abrace em festas irreflectidas, um Brasil que não vacile nos conclaves destruidores de cada lugar-centro de vida.
Há uma Lua belíssima que nasce todas as noites nos países de língua portuguesa. É uma Lua cujos reflexos por entre as terras mais remotas, os mares e os néons, dá as mãos e saúda as falações destes povos cuja morada é a língua portuguesa e que se não despede nunca, antes é o canal ou a reza de um terço que jamais se separará das suas contas.
E Brasil também é África, tal como a Europa também é mundo e tal como o mundo é uno num grosso volume de caminhos.
Todos sabemos ou sentimos que não queremos sociedades sem tranquilidade histórica. Quase todos preferimos que Deus venha quando alguém está pronto. E é nesta alquímica oportunidade que a vida pode ter momentos inesquecíveis enquanto templo de cada um.
À la recherche du temps perdu como uma procura de liberdade condicional? Não!
Não! à falta de estrutura humana. Não às exiguidades disponíveis! Não ao ficarmo-nos pelos sonhos dos outros.
Depois de nados-mortos todos os imperialismos há que prosperar e desenvolver os canais de um tempo à frente. De um tempo sem colonização da publicidade, de um tempo sem entupimentos das economias, um tempo como dizia John Sharkey em que as pedras com buracos eram colocadas à entrada das câmaras funerárias: símbolo da passagem do nascimento.
E África num mundo de pé direito alto na sua primordialidade, na sua anterioridade, num outro processo de iniciação de mãos dadas ao mundo, para que ela, enquanto mundo se analise, e nós através dela numa experiência que a todos pasma, possamos perguntar: quem tem medo de uma nova filosofia da economia?
E dizer todos os dias pela manhã, como um dia li : bom dia pé! Que bom que é ter um pé, isto é dois.
E a voz disse:
Sei que morrerei na esperança, mas essa esperança é preciso fundamentá-la.
M. Teresa B. Vieira
27.05.10
26.5.10
Das vacas magras, sagradas ou gordinhas...
24.5.10
Entre ausentes-presentes e presentes-ausentes, com baboselas e vuvuzelas
21.5.10
A teoria do escorpião, ou o gajo porreiro vestido de animal feroz...
O Saber no Intemporal. De Teresa Vieira
O SABER NO INTEMPORAL: Aqui vos deixo ALEXANDRE O’NEILL
(Tenho para mim que a poesia de O’Neill não se quis Dulce, antes desprendida de regras e convenções e tendo muito artesanato na palavra.
M. Teresa B. Vieira)
Trocar a bicicleta por comida não é de bom ciclista.
Tambor ensurdecedor, ensurdecido, dói-nos na pele, não no ouvido.
Regra para os lojistas: Não pôr os cotovelos no balcão.
Cidália, princesa de três bairros, baixou de golpe a bandeira, dando a partida para o Rali dos Ratos.
No comboio havia um compartimento especial para tímidos, mas estava sempre ocupado.
Enquanto os filósofos etiquetam, os relógios tiquetaqueiam.
Não se lavou duas vezes no mesmo rio. Nunca se lavou.
Não a vendo nem a remendo. Doa a quem doer.
Os fins justificam os meios se os meios forem bons fins.
Mitologia patriótica: Suplício de Tântalo, mas com água da Companhia e fruta da Cooperativa de Fruticultores.
Olhava-se ao espelho pelo buraco da fechadura.
Ao reparar que a banheira estava cheia de água (…) comandou: «Primeiro, os velhos e as crianças!». Então, um velho e uma criança lançaram-se à água e, à falta de outro apoio, agarraram-se aos bordos da banheira, que lá foi derivando.
OS BOTÕES
« - A pena de morte é a única solução para muitos casos. E o próprio juiz e o júri é que carregam, todos ao mesmo tempo, nos botões e um deles liquida o condenado».
20.5.10
Lá vem a nau catrineta, que não tem nada para contar...a não ser delírios em noite que cheira a Verão
18.5.10
Da montanha que deu à luz mais um ratinho, depois de gémitos tremendos ajoelhados
17.5.10
Depois da casa roubada, trancas na porta...
16.5.10
Da crise a uma nova concepção de vida. De Teresa Vieira
A história tem-nos ensinado que os movimentos inovadores, nascem das crises e sobretudo quando estas atingem o máximo.
Não descodifico o máximo já que é uma realidade aferida de modo diferente face às circunstâncias de cada um. Ainda assim, já li o quanto as crises nos ensinam a dizer esperança.
Talvez seja necessária uma determinada crise para que o homem se consciencialize da impossibilidade de continuar a vida em que estava.
Em todas as situações de angústia a vida na cidade torna-se mais imprópria para ser vivida do que a vida no campo. Na cidade ou se inova ou a falta de ar asfixia.
No campo, talvez porque nunca se perdeu o contacto com a grande Mãe-Natureza, os imensos ensinamentos dela, deram, a quem os entendeu, a coerência e o grau de paz que impedem mais facilmente o desespero, inovando-se a cada dia enquanto se aguarda o tempo do semear e do colher.
Curiosamente, as profundas crises também expõem o medo terrível do nada. Exprimem o próprio medo do silêncio, o medo de estar sozinho, o que é diferente do medo da solidão.
Tudo isto é levado a um forte extremo já que o homem da cidade, particularmente este, nunca está consigo, nem para si próprio tem disponibilidade. Então como pode ter disponibilidade para produzir amor? ou para ver uma estrela no céu? Será difícil, digo, que a razão que rodeia os atordoamentos do homem da cidade, possam atentar a estas realidades.
Depois há o oportunismo do ou vens jogar à batota comigo ou…
Parece que o homem que se queixa abertamente de tudo e a todos, tem mais impacto com a pena que inspira do que aqueles que pela dignidade própria e alheia, cuidam que o silêncio seja correctamente interpretado.
É horrível, mas muitos são os exemplos de quem, de tão nada ser, precisa de denegrir os outros para obter graus de satisfação doentia e, de preferência, monetariamente rechonchudos.
Sempre disse que de nada vale ser oficial por grau académico se inimigo do fundo das coisas.
E aí estamos noutra crise gerada também pelo nanismo intelectual que acima referimos: ou seja, pela via da desonestidade que vai tendo êxito, se o próprio que a pratica se salvar, enterrando vivo, não importa quem.
Há que contar com a mediocridade de quem aprecia estas posturas e, repita-se, o quanto Marx dizia que realmente o grande problema do homem era a diferença entre a essência e a existência.
O homem pode até ter uma certa essência, mas ai que raramente consegue tornar a existência igual à essência.
Acreditamos que o sistema de carência nutricional a nível da razão da ética e da moral tem sido o que leva ao fenómeno da bulimia tão presente nos dias que correm.
A mesquinhez do dizer mal canalizado na água corrente, satisfaz a sede dos ratos que pululam na dissimulação do mal que fazem, sob a capa de celestiais seres que afinal, muitas vezes, de jeito impune entopem o futuro e queixam-se das crises como se não se descobrisse nunca o seu grau de culpabilidade imensa.
Todos conhecemos alguém que, pleno de mérito, lhe faltou a dada altura da vida o essencial à sobrevivência e, todos sabemos quantos não o auxiliaram no mais premente dos segundos dos dias, e quando estes não davam sequer pelo nome de crise, mas antes pelo nome de mundo de onde o verbo dever se tinha ausentado.
O verbo dever é, para muitos, o pior verbo que há, até porque implica uma regra. Note-se.
E como quase todos conhecemos já alguém na situação acima descrita, já quase todos fomos capazes de abandonar outrem com uma inclemência que não sustenta muitas das palavras que agora querem pronunciar acerca da crise actual.
De facto, não receio que quem só coma pão, possa ter de comer menos pão. Antes todos nos devemos envergonhar se permitimos que até hoje alguém só comesse pão, ou nem isso.
Este momento deve ser vivido também como um momento de profunda renovação interior. Muitos foram os erros que se cometeram e que se permitiram ou mimetizaram para que chegássemos a este tipo de crise.
A festa da abundância de valores festeja-se na comunhão da solidariedade.
As crises também só se ultrapassam em comunicação dos homens entre si. Recordemos a frase de Saint-Éxupery que diz: «Nós que cultivamos a amizade entre os homens, os pequenos encontros transformam-se, por vezes, em festas maravilhosas.»
As pessoas do mundo de Éxupery não são gente de roleta, são gente do tipo humano.
São gente que não sente gulas a não ser a que as leva ao esforço por se melhorarem. Aquelas, que levam também na crise em que estamos inseridos, a que todos possam vir um dia a compreender o que revelavam as palavras de Fernando Pessoa: «Quando olho para o meu prato vejo a natureza toda como um jardim, como se fosse uma pintura da natureza dentro do prato.»
Talvez depois, talvez quem sabe? com a desintoxicação do espírito e o alívio de muitos tipos de fome, a emanação do homem possa dar uma outra dimensão à vida.
Jean Delumeau afirmou que « a história antes de mais individualiza o “iceberg”ao descobrir a realidade dos extractos sociais que não contavam, mas que eram fundamentais aos equilíbrios.» enquanto um dos meus heróis da Literatura – Ítalo Calvino – apontava a necessidade da chamada participação ideológica de maturidade.
Em rigor, a história tem-nos ensinado que os movimentos inovadores, nascem das crises e acredito que só com novos valores teremos uma nova economia.
E ainda acrescento que só se deveria construir o mundo a partir dos traços do novo.
M. Teresa B. Vieira
16.05.10