a Sobre o tempo que passa: Conhecimento puro. Texto de Martim Avillez Figueiredo

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

8.4.05

Conhecimento puro. Texto de Martim Avillez Figueiredo



Lê-se no "Diário Económico" de hoje:

Portugal não é especialista em livros de referência. Com esta obra, que percorre dois séculos da vida nacional, dá-se um passo de gigante.

Em 80 anos, 55 governos. Em 80 anos, 45 eleições. De 1820 a 1910, foi assim a história eleitoral de Portugal. Nada de estranho para quem viveu nos últimos três anos neste mesmo país: duas eleições, quatro governos, quatro primeiros-ministros. Na verdade, esse período entre 1820 e 1910 apresentou médias bem melhores do que as dos últimos anos. Das 0,5 eleições/ano e os 0,7 governos/ano entre 1820 e 1910, o presente muito recente conquista o pódio com a espantosa média de 0,66 eleição/ano e 1,33 governos/ano. Não está mau para o país dos brandos costumes.

Esta informação, útil, histórica, relevante, é apenas uma parte (ínfima) de tudo o que se pode encontrar numa das mais notáveis obras publicadas no último ano em Portugal: “Tradição e Revolução, uma biografia do Portugal Político do século XIX ao XXI”. O livro, em dois volumes, é tanto mais notável por ser raro num país pouco habituado a contar a sua história assim, em formato de consulta e referência rápida. Dito de outra forma: o país não usa dicionários, e por isso não os edita. Com este quase “dicionário” político - com a informação detalhada e separada por anos - dá-se um importante passo para nos aproximar do que se passa um pouco por toda a Europa civilizada - a edição de obras que “contam” a história em números, tabelas e pequenos textos de referência. José Adelino Maltez é o autor, um conhecido catedrático com dezenas de obras escritas em torno na vida política nacional. Um livro indispensável para qualquer estante que se deseje informada.




Guia de leitura

Não é igual a um dicionário, mas a arrumação por ano histórico permite consultas rápidas e eficazes.

O dois volumes dividem-se de igual forma: cada ano da vida de Portugal é preenchido pelos acontecimentos que o marcaram. Isto é, não se podem procurar referências por acontecimento (a revolta liberal, por exemplo) mas por datas. Assim, quem queira rever as revoluções liberais deve “viajar” até às páginas do ano de “1820”.

Aí encontra-se logo a abrir a página um resumo brevíssimo do ano (no caso “revoltas liberais e eleição das cortes gerais”, acompanhadas de citações de conhecidos autores da época) como, em seguida, se revêem os tais acontecimentos marcantes de forma rápida, concisa e informativa - o que permite uma informação muito mais rigorosa do que aquela que se poderia encontrar num simples dicionário onde se procurasse a entrada “revoluções liberais”. Em pequenas caixas, que acompanham os anos, a notável contabilização de actos eleitorais e governos que já tomaram conta de Portugal: 1909, por exemplo, foi ano de três governos, respectivamente o governo 52, 53 e 54 desta espantosa colecção de chefes de estado que teve início em 1820.