a Sobre o tempo que passa: Ainda estou na praia do Lizandro

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

9.11.07

Ainda estou na praia do Lizandro


Agradeço a Fernanda Valente ter-me recordado que já estive na Praia do Lizandro. Porque o poeta, por vezes, apenas descreve sentimentos, nas paisagens íntimas que observa, observando-se. Especialmente quando a vida é tão intensa que apenas apetece vivê-la. Outras vezes, é o próprio poema explodindo por dentro de si mesmo. Quando surgem rimas automáticas, num ritmo quase febril, palavras em convulsão que a caneta não consegue reter. Mas a poesia também acontece quando glosamos palavras que, já antes, foram escritas. Quando versos, feitos reversos, aperfeiçoam poemas imperfeitos que, outrora, nos vieram. Hoje, não. Aqui na praia do Lizandro, diante do mar, sentado na areia molhada da manhã, meus versos fluem saudosos, como se estivessem inspirados na solidão de estar aqui. No silêncio da praia deserta, sentindo o sol doirar meu corpo e molhando os pés, depois de uma longa caminhada, neste prazer de estar aqui, vou pensando nos sonhos que, de noite, me atomentaram e que lembrei ao acordar. Retomando quem sou, dói o prazer de estar aqui, escrevendo em mim estas palavras de solidão.