a Sobre o tempo que passa: O Processo de Desinstitucionalização em Curso (PRODEC)

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

14.11.08

O Processo de Desinstitucionalização em Curso (PRODEC)


Chegam-me, de vez em quando, alguns pedaços de correio electrónico, invocando o facto de estar longe, fora do bulício e agitação que grassa pelas terras europeias do antigo império, onde imaginam que o afastamento corresponde a paz e sossego bem diverso do que se passa nesse reino da macacada, onde consta que há um plano previamente traçado para destruir a escola pública. O que hoje transcrevo rima perfeitamente com a carantona não apenas da senhora ministra, mas de muitos outros ministros socratizados pelo propagandismo disciplinado que pensa vencer as sucessivas tempestades com discursos de brigada do reumático. Infelizmente, nem sequer compreendem que actuam como aliados objectivos de todos os vermes que estão a desinstitucionalizar a comunidade, ou república, com o seu pluralismo plurissecular. Um pouco como um destes sapos exóticos que forças militares vindas de outras ilhas aqui lançaram para limpar Timor de cobras venenosas, mas que se trasnformaram numa praga semelhante à dos coelhos de outrora na Austrália.

A maior parte destes desinstitucionalizadores, que passaram de revolucionários frustrados a ministros dos estadão, através daquele clique em que as mãos do primeiro-ministro os propuseram ao presidente, pensam que é através deste terrestre carisma que a ave da sabedoria levanta voo ao entradecer e, por tudo e por nada, entre os palanques inaugurativos e os microfones de telejornal, botam faladura tão empoeirada de cremes e arrozada quanto os gaguejos em que são apanhados. Dizendo que são de esquerda, com a mesma convicção com que poderiam dizer que eram de direita, não têm sobre o aparelho de Estado que foram obrigados a mostrar obra qualquer ideia de obra, a não ser aquela que os jovens assessores lhes traduzem em calão tecnocrático sobre o último relatório da OCDE ou do PNUD para um desses países que promete sair do quarto para o terceiro mundo. 


Regras de processo são coisas que o escritório do amigalhaço em "outsourcing" conseguem reparar com cola e cuspo de muitas cláusulas matreiras, ao ritmo daquele velho princípio da legalidade que sempre foi o exacto contrário do Estado de Direito, porque tanto a Inquisição como a Pide eram veneráveis instituições que cumpriam as leis e os regulamentos em vigor e os bons costumes dos certificados que passava o ti Regedor. Aliás,  é ver, hoje, entrar nos gabinetes o jovem advogado metrossexual e a juvenil advogadíssima mais pró hetero, recentementevítimas do desempacotamento hetero, a quem mandam os últimos processos disciplinares dos dissidentes e sindicalistas, enquanto os mais calejados de rabo e manha, são os ilustres causídicos a quem mandam fazer as discursatas e os relatórios dos diplomas, até porque, quando eles são aprovados, sempre os ditos podem pôr, no "portfolio" do escritório, que foram os autores da lei x ou y e que, portanto, estão preparadíssimos para mais um curso de formação profissional intensiva aos peritos dos órgãos de soberania que aprovaram a coisa proposta por estes agentes neofeudais.


Finalmente, a desinstitucionalização passa pela liquidação das últimas manifestações de comunhão que se manifestavam entre os membros do grupo. Aquela comunidade entre as coisas que se amam que nunca tinha sido incompatível com a burocracia, quando esta tinha uma missão que não tinha sido escrita pelos tipos do PRACE do senhor Teixeira dos Santos e do senhor João Figueiredo que, entretanto, já deu às vilas Diogo do mais vale um pássaro na mão do que ter aturar cursos de formação na universidade. Manifestações de comunhão é coisa que o "agenda setting" dos novos donos do poder foi buscar às aprendizagens de extrema-esquerda e de extrema-direita dos tempos do PREC, com algumas pitadinhas de seminarista baladeiro. Logo, à boa maneira do Maquiavel da razão de Estado bem cristã, nada melhor do que o neofilipismo da sacanagem catolaica e congreganista do "divide para reinar" e do "faz e desculpa-te com os erros do chefe da secretaria ou da contínua que ainda ontem fazia torradinhas ao chefe de posto".


Por outras palavras, meu caro, a antiga capital do império, voltou novamente a ser colónia, colonizando-se a si mesma, através destes agentes inconscientes de novos donos do poder que lavam as mãos como Pilatos, assentes em reformas douradas, porque sabem que reina o desregramento do sapateiro de Braga, onde tanto não há moralidade como não comem todos neste fartote do ver se te avias. Ao pé disto, os walters, os pedreiras e as rodriguinhas nem merecem que  renunciemos a ovos estrelados, escalfados ou omeletizados. Eles são umas criancinhas de coro, isto é, não são causas, são meros sintomas desta ditadura da incompetência que há muito nos minou por dentro, fazendo apodrecer as raízes e impedindo a regeneração que costumava vir de dentro. Porque, por aí, onde Roma até paga aos traidores, a fila dos denunciantes à porta do chefe é enorme, para ver se ainda apanham os últimos restos carreirísticos que sobejam da orgia porcina  em que se transformou a mesa do Orçamento.  Aliás, Hispania, o nome original, também queria dizer terra de coelhos, como nos antípodas, embora o ritual da luta de galos com galinhas, em nome da igualdade do género, se mantenha tão bárbara como a velha tourada dos agrobetos...